APUB SINDICATO DOS PROFESSORES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR DA BAHIA

De mãos dadas com a democracia, pela universidade e por direitos

A atual conjuntura: para além da Emenda Constitucional 95

A superação da atual rota de desastre anunciado, consequência do congelamento de verbas para as áreas sociais, por 20 anos, passa necessariamente pela revogação da Emenda Constitucional 95 (EC 95), que o determinou. Essa, contudo, não é condição suficiente para a implantação de políticas públicas que revertam o quadro de profunda desigualdade que assola o País, e que só será revertido com a progressiva implantação de políticas que levem à oferta de serviços de qualidade, como educação (em todos os níveis, da pré-escola à pós-graduação) e saúde, a toda a população brasileira, de forma inclusive e universal. Não se trata de um projeto impossível, e muito menos incompatível com as possibilidades de uma nação que ocupa lugar de destaque mundial, em termos de produção de riquezas. O que é preciso compreender é o que faz com que esse projeto – cujo completo antípoda é hoje implementado pelo atual governo – jamais tenha sido efetivamente trilhado, apesar do voto majoritário que, há tempos, tem a favor dele sido sufragado pela maioria da população brasileira.

A face mais perversa dos atuais rumos político-econômicos que vêm sendo imprimidos é o fosso que os separa daquilo que foi democraticamente aprovado nas urnas: mais verbas para as áreas sociais, mais distribuição de renda. O carro chefe dessa mudança de rumos foi a aprovação da EC 95, por um Congresso Nacional que, conhecido por todos, dispensa qualificações.

Revogar a EC 95 é,  portanto, tarefa  prioritária, mas não  suficiente: eliminar o  congelamento de verbas públicas para a educação, que  destruirá e  inviabilizará orçamentariamente  as Universidades e os Institutos Federais e impedirá a implantação do Plano Nacional de Educação (PNE) é, pois, fundamental; mas apenas isso não garantirá, nem remotamente, que esse mesmo PNE venha a vigorar futuramente. É por isso que, nesta conjuntura dramaticamente adversa, é preciso dar um passo adiante, e debater o que é de fato condição para que o Brasil  possa  dar  passos  decisivos  para  a redução das brutais desigualdades que mancham a história do nosso País.

Fruto dos trabalhos de  estudos criteriosos e  detalhados de  diversas entidades nacionais (como   a Campanha Nacional pelo Direito à Educação e o PROIFES,  dentre  outras),  ficou  estabelecido  alguns anos atrás que, para que possamos ter uma educação de  qualidade, universal e  gratuita, em todos os níveis de ensino, é preciso aportar anualmente para a educação pública, a  médio prazo, cerca  de 10% do PIB, o que significa um  acréscimo de  cerca de  4%, em  relação aos dados vá lidos para o ano de 2015.

Já em saúde pública o investimento é inferior a 4%, enquanto a  média da  OCDE  é  de  quase 7%, o  que aponta para um suplemento de, no mínimo, 3% do PIB. Vale ressaltar que, a  médio prazo,    a demanda de verbas por educação tende a cair, já  que  a  população mais jovem tende  a  decrescer; mas, ao mesmo tempo, com esse envelhecimento, a tendência é aumentar o valor dos recursos necessários à saúde. Esses dados, somados ao que é preciso  investir  em  habitação, saneamento e  outras áreas, nos mostram que será preciso encontrar fontes que suplementem os atuais investimentos sociais de forma muito significativa. A questão que se coloca, pois, é saber de onde viriam esses  recursos e, caso existam, compreender o que impede a sua efetiva destinação, rumo à  oferta  de serviços de qualidade para todos. Portanto, apontar unicamente para a revogação da EC 95 –  embora isso seja absolutamente essencial – não é suficiente, se quisermos ir além de uma análise superficial.

EC 95: caos para Universidades e Institutos, para a educação e para as áreas sociais

Para analisar as consequências da EC 95  na  próxima década mencionamos o  “Estudo Técnico nº 12/2016”, publicado pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados, precisamente com o objetivo de subsidiar os parlamentares daquela Casa, quando  da votação da então PEC 241 (depois EC 95). Esse “Estudo” apresenta projeções para a economia  brasileira (por 10 anos), com destaque para perspectivas de inflação e crescimento futuros do PIB.

A partir dessas projeções e do texto da EC 95 é possível construir a (provável) trajetória da relação entre os investimentos nas áreas sociais (que essa emenda congela, em valor real) e o PIB do

Brasil. Essa trajetória é declinante,  porque o PIB (assim  afirma  o “Estudo”) irá crescer progressivamente, em termos reais, enquanto a parcela a ser destinada para as áreas sociais fica congelada. Daí resulta  que (supondo-se que a arrecadação permaneça constante) a destinação orçamentária para o pagamento da Dívida Pública seguirá, ao contrário, uma curva ascendente. O resultado que se obtém (usando-se também dados relativos à proposta de Reforma da Previdência) é:

Situação atual (2017)

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Projeção para 2026, com EC 95 e  com Reforma da  Previdência

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Projeção para 2026, com EC 95 e  sem Reforma da  Previdência

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Em resumo, o que a EC 95 produzirá, nos primeiros 10 anos, será o aumento da fatia orçamentária destinada ao pagamento do serviço da Dívida  Pública (de 3,5%  para 6,5%  do  PIB),  junto com a redução dos investimentos em áreas sociais, que cairão de 15,5% para 12,5% do PIB. Os gráficos acima mostram dois cenários possíveis. O primeiro, resultante da eventual implantação da Reforma da Previdência proposta (e não aprovada) pelo governo, ‘dividiria a miséria’  nas  áreas  sociais, contraindo, de um lado, recursos previdenciários e,  de  outro,  destinações orçamentárias para as áreas sociais (educação, saúde, etc.). O segundo, sem Reforma da Previdência, implicaria redução muito mais abrupta dessas últimas destinações, que sofreriam um declínio ainda mais brutal (de  8,5% do PIB para 5,5% do PIB) – isso em uma década; na década seguinte de vigência da EC 95 essa  tendência continuaria, com o aprofundamento do caos em que mergulhariam todos os  serviços  públicos.

Quem se beneficia com as políticas em curso?

O grande beneficiário será o setor do grande capital financeiro.

Hoje, a Dívida Pública  brasileira, que hoje alcança quase 70% do  PIB, é  remunerada às taxas  de juros mais altas do planeta (que têm oscilado entre 5% e 7%, em valores reais). Assim, o serviço anual da dívida  demanda entre 4%  e  5% do PIB, anualmente, e  estaria plenamente contemplado com  o aumento da parcela orçamentária a ser destinada, às custas da redução do investimento social.

A guinada de rumos atualmente em marcha – instrumentalizada pela EC 95  –  interessa, portanto, ao grande capital e, também, a todos os segmentos (inclusive do setor produtivo, do comércio) que, de uma forma ou de outra, lucrem em decorrência de sua financeirização , ainda que parcial. Não é por outro motivo que parte importante desses segmentos  aceita,  caudatário  e  subalterno, a nova lógica – que, contraditoriamente, tende a prejudicar parte do próprio segmento, na medida em que se implanta um modelo que irá provocar forte retrocesso na red istribuição de riquezas  e, consequentemente, afetará os interesses daqueles que se beneficiariam por um crescimento do consumo interno.

Há, contudo, outro segmento vivamente interessado nas atuais mudanças: é o que representa os interesses estrangeiros dos que pretendem explorar (e espoliar) as riquezas nacionais. Não é por outra razão que, junto com a EC 95, vêm sendo tomadas as seguintes medidas: a lateralização da Petrobrás, em relação à exploração do présal – com o que serão ainda mais reduzidas  as perspectivas  de destinação de recursos para a educação; a suspensão do debate  sobre a  definição de  um  novo  marco para a exploração mineral (que poderia rever os percentuais ridiculamente baixos cobrados no Brasil); e a abertura da possibilidade de compra irrestrita de terras  brasileiras  por  estrangeiros  – dentre outras.

Esses são os dois pilares do golpe político que assola o Brasil , como resultado de um processo em que foi deturpado e desconsiderado o voto popular dado em 2014 , tendo como fio condutor –  em  vez do uso da força bruta, como dantes – o eixo jurídico midiático de ação, que engendrou a narrativa necessária à usurpação do poder constituído.

Mais adiante, em um segundo movimento, afasta -se da nova disputa presidencial, de forma unilateral, o principal representante de um dos polos do embate eleitoral deste ano de 2018, na expectativa de dar continuidade a essa usurpação.

Independentemente de uma avaliação específica do mérito ou não dessa iniciativa, fica patente que estão sendo usados dois pesos e duas medidas, com o objetivo evidente de desequilibrar o jogo de poder, em favor daqueles mesmos dois pilares que, em causa própria, são os principais responsáveis pela manutenção e aprofundamento da desigualdade e da injustiça no nosso País.

Entretanto, como sempre, um desastre não acontece em decorrência de uma única causa ; no caso em tela, aliou-se um executivo frágil a um Congresso Nacional em que, de forma amplamente majoritária, estavam representados os interesses acima apontados, e com os quais, portanto,  não cabiam mediações e alianças incompatíveis com o programa declarado do governo eleito; sacrificar a política em prol da permanência no poder, além de nem sequer garanti-la, como o demonstrou a  história, rompe com a ética.

A atual sequência de eventos mostra, cruelmente, que há limites para quaisquer tentativas de diminuir a visibilidade das diferenças de interesse existentes. Ao agir assim, além da fronteira do razoável, impede-se que as contradições venham a claro, deixa -se  de  explicitar conflitos  de fundo  que, em última instância, estão na raiz das travas que impedem avanços sociais concretos; e, quando estes ocorrem, como políticas de governo, podem e muitas serão descartados logo à frente, com o estabelecimento de duradouras e retrógradas políticas de Estado. Parece inevitável, pois, que  se  proceda – ainda que neste delicado momento – a uma crítica (autocrítica para alguns) que analise sem rodeios essas questões.

PNE – revogar a EC 95 é urgente, mas não chega – é preciso enfrentar contradições de fundo

Como visto, caminhar em direção a um Brasil socialmente  menos injusto  demanda investimento suplementar muito significativo nas áreas sociais. No que concerne  à  educação, está  claro que o adicional necessário é algo em torno de 4% do PIB, anualmente.

O mesmo raciocínio utilizado acima mostra que, considerados os  dados  do  estudo  da  assessoria da Câmara Federal, a vigência da EC 95 nos imporá a redução dos investimentos em educação, que passarão dos atuais (quase) 6,5% do PIB/ano  5,5%, em  10  anos, e  para 4,5%, em  outros 10 anos. Isso significa inviabilizar a Meta 20 do PNE (10% do PIN/ano, em  10  anos),  e, portanto, inviabilizar o próprio PNE.

O gráfico abaixo ilustra essa situação.

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Vê-se que, se a EC 95 for mantida, a linha de declínio do investimento em educação será mandatória.

A pergunta complementar que é preciso fazer, contudo, é a seguinte: revogada a EC 95, de onde viriam os recursos de 4% necessários à implantação do PNE. Esses recursos são da ordem de um quarto de trilhão de reais/ano e a resposta a essa questão é que, sem o enfrentamento do grande capital financeiro, dos ricos e poderosos deste País, isso não aconteceria. Assim como não aconteceria investimento capaz de transformar os serviços públicos de saúde no Brasil – cuja fragilidade gera, dentre outras consequências, como é de conhecimento geral, corrida aos planos de saúde privados, cujas mensalidades sobem desatinadamente, justificadas por ‘sinistralidades’ que jogam os usuários uns contra os outros.

Reforma fiscal: como arrecadar mais, cobrando de quem tem mais

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O quadro acima dá algumas pistas. No Brasil e na Argentina, quando comparados aos Estados Unidos e ao Canadá, cobra-se a metade dos impostos sobre a renda e a propriedade; enquanto se toma o dobro da população em geral (impostos sobre o consumo). Como reverter isso, na busca daqueles 4% necessários para a educação? A resposta é tecnicamente elementar, embora envolva uma dificuldade política monumental, já que se pressupõe o enfrentamento dos mais ricos e poderosos.

Senão vejamos:

  • Recursos do petróleo. A Lei nº 12.858/13, destinou 50% do Fundo Social (criado pela Lei da Partilha) e de 75% dos Royalties e Participações Especiais da União para a educação e saúde. Previsão (Assessoria de Assuntos Energéticos da Câmara Federal), feita em 2014: em 10 anos, 0,8% do PIB/ano podem ser canalizados para a educação, por essa via (entretanto, o PLS 131/16, de José Serra, 2016) retira a obrigatoriedade da Petrobrás atuar como operadora / ter 30% de participação mínima nos consórcios do pré-sal e, portanto, pode cair a participação do ‘excedente em óleo’ que geraria os recursos para a educação.
  • Demais recursos minerais. No Brasil, os royalties sobre a exploração das riquezas minerais são muito baixos: ferro, 2%; alumínio, 3%; manganês, 3%; ouro, 1%; pedras preciosas, 0,2%. Comparação: Canadá, 3% a 9%; EUA, 5% a 12,5%; Austrália, até 30% da produção bruta minério de ferro. Um novo ‘Marco da Exploração Mineral’ poderia, pois, elevar a CFEM (Contribuição Financeira sobre a Exploração de Recursos Minerais) – chegando-se, assim (vários estudos), à destinação de mais 0,4% do PIB/ano para a educação.
  • Contribuição progressiva sobre movimentação financeira. No Brasil, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), com alíquota de 0,38%, sobre transações bancárias, foi extinta em 2007; rendia, então, R$36,5 bilhões, ou 1,4% do PIB / ano. É essencial retomá-la – não como era, mas tornando-a progressiva: maior movimentação, maior percentual.
  • Taxação sobre especulação financeira. No ano de 2015 o movimento em bolsa (incluídos contratos de índice, de dólar, de juros, etc.) alcançou um total de R$ 60,58 trilhões, ou 10,3 PIBs (http://www.bmf.com.br/bmfbovespa/pages/boletim1/VolumeGeral/VolumeGeral.asp). Portanto, adotando alíquota de 0,1% sobre essas transações, arrecadar-se-ia 1,0% do PIB / ano. 
  • Regulamentação do imposto sobre grandes fortunas. A CF (Art.153, inc.VII) autoriza o Governo a cobrar um imposto s/grandes fortunas e prevê que lei complementar discipline a matéria. Nenhuma das iniciativas enviadas ao Congresso Nacional prosperou. Uma delas, o PLC 48/2011, se aprovada, renderia 0,3% do PIB / ano. De acordo com esse PL, 70% desses recursos viriam (em reais de 2012) de fortunas superiores a R$ 116 milhões. No Brasil 901 pessoas (dados do IBGE, de 2012), com riqueza média de R$620 milhões cada uma, detêm patrimônio equivalente a 13%do PIB (desse ano).
  • Fim das ‘desonerações tributárias’. O auge das ‘desonerações tributárias foi em 2012, quando alcançaram R$ 142 bi. Em 2016, foram de R$ 91 bi, montante superior a 1,5% do PIB / ano.

Em resumo: uma rápida soma dos itens mencionados mostra que aí estão mais do que 5% do PIB / ano, suficientes para financiar, com sobras, uma educação de qualidade em todos os níveis e modalidades e, além disso, dar forte impulso aos investimentos em saúde pública.

Não é suficiente, entretanto, alinhar tão somente os itens acima, sem mais comentários. É preciso ressaltar que, não só neste momento, mas nas décadas precedentes, não foram explicitadas nem enfrentadas as contradições que existem entre os interesses dos que seriam afetados pelas medidas acima e o projeto mais amplo de construção de um Brasil cidadão.

Em nenhum momento se tratou de efetivamente implantar a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas – um dos avanços constitucionais que os setores populares alcançaram em 1988.

Tampouco se tratou da taxação da especulação financeira, cuja ciranda retira da economia produtiva vastas quantidades de recursos, a cada dia. Registre-se que essas gincanas não são do interesse do País, que deveria prezar o capital investido – a longo prazo – na produção, e não o giro predatório dos chamados ‘day trades’, que poderia e deveria ser fortemente taxado; e nada perderíamos em caso de evasão.

Mesmo no auge do governo passado, houve grande resistência à destinação dos recursos do petróleo para a educação e para a saúde – posto que foi defendido pelos dirigentes de então que apenas os juros do Fundo Social (FS) fossem para essas áreas; o repasse da totalidade do FS (cujo montante será fortemente afetado pelas manobras do atual governo) só foi aprovada, à época, depois de muita pressão popular.

Com relação às desonerações tributárias, basta dizer que atingiram o pico em 2012 (mais de 2,5% do PIB).

Mas há mais do que isso, porque, por cúmulo, além de não recolhermos o que deveríamos dos que podem e deveriam contribuir, ainda os brindamos com retribuições financeiras que só aqui existem.

Auditoria da Dívida Pública: como destinar menos a quem já tem demais

 O Brasil utiliza imensos recursos para remunerar o grande capital. E, com a aprovação da Emenda Constitucional 95, não apenas inviabiliza a destinação de mais recursos para a educação, conforme a agenda indicada acima, como prevê a continuidade e o aprofundamento da destinação de verbas para o pagamento dos rentistas, do grande capital. Diga-se, de passagem, que a CF 88, em seu Art.71, possibilita a realização de auditorias, como a necessária em relação ao pagamento da Dívida Pública; isso nunca foi feito, e – de novo – nem sequer proposto. Por esse ralo escorrem ao menos outros 4% do PIB, anualmente.

 No Brasil, não houve até hoje enfrentamento efetivo dos interesses do grande capital – contraditórios com a construção de uma sociedade socialmente mais justa.

 Há que deixar claro que todas essas iniciativas – quer no âmbito fiscal, quer no de uma possível auditoria – certamente seriam barradas pelo Congresso Nacional, posto que sua composição espúria e contrária aos interesses populares é largamente conhecida.

Mas há também que atentar para o fato de que, de forma geral, essas medidas e enfrentamentos não foram sequer propostos pelos sucessivos executivos federais, que, ao contrário, apoiaram Reformas da Previdência que fragilizaram os trabalhadores – nas IFES, por exemplo, foram extintas as aposentadorias integrais e paritárias, com a introdução de lógica de favorecimento do capital privado (fundos de previdência complementar).

Universidades e Institutos Federais: é preciso realçar os decisivos ganhos, para instituições, seus docentes e para a população brasileira, das políticas públicas dos governos 2003-2015.

 Não é possível, por outro lado, fazer tábula rasa de todas as políticas, igualando-as de forma injusta e aligeirada. Esse tipo de postura sectária, ao aplainar diferenças que foram, no âmbito da rede de Universidades e Institutos Federais, muito significativas, contribui para que se deixe equivocadamente de registrar os aspectos positivos de políticas implementadas em governos anteriores (2003-2015) – a despeito de todas as limitações e indefinições já apontadas.

Nas Universidades Federais (bem como no conjunto das instituições de ensino superior da rede pública), houve um crescimento sem precedentes no número de matrículas, além do que foram criadas diversas instituições. A rede de Institutos Federais, por seu lado, implantada – em grande parte – nesse período, teve um crescimento vertiginoso, o que representou um imenso legado para o País, em especial no que tange ao desenvolvimento tecnológico. Foi criado o programa REUNI, que injetou parcela importante de recursos públicos nas Universidades Federais e foi um motor importantíssimo do seu crescimento.

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O número de professores nas Universidades Federais, simultaneamente, e em consonância com esse quadro, cresceu de forma muito significativa, conforme demonstra o gráfico abaixo.

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Mais que isso, os governos do período tiveram sensibilidade para, a partir de (longas e difíceis) negociações, valorizar fortemente a carreira de professor do Magistério Superior (MS). Ao mesmo tempo, foi criada a partir de acordo com o PROIFES a nova carreira do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT), em que hoje está a imensa maioria dos docentes dos Institutos Federais (e alguns das Universidades Federais), com estrutura e malha salarial homóloga à do Magistério Superior.

O resultado foi a implantação de carreiras (MS e EBTT) que hoje são estimulantes, diferentemente do que ocorria nos anos 90, em que o professor doutor, após 6 anos, não podia mais progredir – na época, ficávamos estagnados em adjunto 4, já que era necessário que houvesse vaga para que se pudesse prestar concurso para titular. Ademais, hoje é possível chegar a esse posto pela via da promoção interna, após análise de desempenho acadêmico.

Como fruto desses inegáveis avanços e, sobretudo, de negociações salariais que, corretamente, outorgaram tratamento diferenciado aos professores federais, o salário do topo das carreiras atuais (MS e EBTT) está atualmente – pela primeira vez – próximo à média do teto remuneratório das chamadas Carreiras Típicas de Estado (SUBSÍDIO). Os vencimentos dos docentes, além disso, situam-se hoje nos melhores níveis de todos os tempos, em termos reais – como demonstram os gráficos a seguir (estão aí incluídos os aumentos decorrentes do Acordo/2015, que vão até agosto/19, conforme legislação em vigor).

Evolução dos salários reais dos docentes da ativa (c/doutorado, DE), 1995 -2019

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Salário teto das carreiras que recebem por SUBSÍDIO (Carreiras Típicas de Estado), tomado como 100, comparado com os salários das carreiras federais que levam em conta titulação (incluindo MS e EBTT)

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Instituições Federais de Ensino (Universidades e Institutos) sob a EC 95: imenso retrocesso.

As redes de Universidades e Institutos Federais, que se expandiram vigorosamente no período 2002-2015, experimentarão, sob a EC 95 e caso não seja esta revogada, um período de catastrófico retrocesso.

Utilizando os mesmos dados já referidos, é possível prognosticar as seguintes consequências, para os próximos 20 anos:

  • Congelamento de contratações em todas as instituições (Universidades e Institutos Federais), com perda de qualidade dos cursos já instalados, impossibilidade de continuação dos que estão em implantação, superlotação das salas de aula e aumento expressivo de carga de ensino para os professores, em prejuízo da pesquisa e da extensão;
  • Congelamento nominal dos salários, com desestímulo e desvalorização da profissão de professor de Universidades e Institutos Federais;
  • Aumento da parcela de docentes temporários e substitutos, e respectivo impacto na qualidade do ensino, pesquisa e extensão;
  • Declínio acentuado das verbas de custeio e de investimentos, inviabilizando o funcionamento das IFES, no curto prazo, e afetando a formação de profissionais, a produção de conhecimento, a concessão de bolsas de estudo, a manutenção dos laboratórios e, assim, o desenvolvimento científico, tecnológico e social do Brasil.

Os cortes, de impensável monta, já podem ser avaliados pelos seguintes números:

  1. Orçamento de investimento das Universidades Federais: 2015 – 13 bilhões de reais; 2017

– 8,7 bilhões de reais; 2018 – 5,9 bilhões de reais;

  1. Orçamento de investimento dos Institutos Federais: 2015 – 7,9 bilhões de reais; 2017 – 3,7 bilhões de reais; 2018 – 2,8 bilhões de

Conclusão: a inviabilização de Universidades e Institutos Federais brasileiros se dará a curtíssimo prazo, já a partir deste ano de 2018. Não é por outra razão que a grande imprensa já pauta com insistência o ‘ensino pago nas IFES’, ameaça que irá rondar as nossas instituições muito em breve, ameaçando reverter a trajetória de inclusão antes em curso; sem contar a pressão para venda de serviços para o setor privado.

E o orçamento de ciência e tecnologia deste ano é 60% inferior ao que era 4 anos atrás.

***

Esse caminho só tem volta se pudermos eleger executivos e parlamentares comprometidos com a revogação da EC 95 e, muito para além disso, dispostos a desafiar os privilégios que muito poucos acumulam, em detrimento dos interesses da imensa maioria da população brasileira. 

Texto: Adufscar

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