APUB SINDICATO DOS PROFESSORES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR DA BAHIA

De mãos dadas com a democracia, pela universidade e por direitos

Necessidade de construir convergências e apresentar projetos alternativos são destaques na abertura do Seminário Nacional Universidade Pública: autonomia e financiamento

Em um cenário de asfixia financeira, campanhas difamatórias e com o projeto “Future-se” apresentando-se como falsa solução e ameaçando a autonomia das Universidades Públicas, a Apub Sindicato e o PROIFES-Federação realizam o Seminário Nacional Universidade Pública: autonomia e financiamento, nos dias 03 e 04 de outubro em Salvador. A atividade, que faz parte da programação da Greve Nacional da Educação, é uma das estratégias de resistência ao projeto de desmonte da educação pública brasileira promovido pelo atual governo, no sentido de construir subsídios sólidos para o urgente debate sobre qual projeto de Educação, Universidade e de país precisa ser defendido.

A análise da conjuntura, com seus principais cenários e desafios, pautou a mesa de abertura, composta pelas professoras Maria Stella Goulart (Apubh), Raquel Nery (presidenta da Apub), Luciene Fernandes (vice-presidenta do PROIFES-Federação) e pela estudante Júlia Aguiar (UNE). A coordenação foi das professoras Cláudia Miranda (Apub) e Patrícia Plentz (Apufsc).

Em uma exposição no qual o resgate a Paulo Freire foi fio condutor, a professora Maria Stella apontou a necessidade de abraçar o conceito de conscientização. Ela fez o convite à reflexão sobre “quem são eles” e “quem somos nós e o que queremos”, a partir do lugar de educadores/as e ativistas/as. “Temos que entender suas formas e contornos para nos insurgir, mas sem nos transformamos nos dragões contra os quais lutamos”, disse. Ela saudou todos e todas que se mobilizaram pela Greve Nacional da Educação e destacou que os diversos ataques perpetrados pelo governo Bolsonaro tendem a continuar, uma vez que o orçamento planejado para 2020 volta a patamares de dez anos atrás. “Temos um limite de tempo, que é dezembro, para pressionar nossos parlamentares e impactar o nosso povo”. Outro ponto, foi a importância de articulação com os movimentos sociais, responsáveis por trazer à superfície o que estava invisibilizado pela opressão, e dessa forma “educar para outros mundos possíveis”.

A presidenta da Apub, Raquel Nery, apresentou em sua fala o contexto da idealização do Seminário – a partir de posicionamentos do XV Encontro Nacional do PROIFES, que ocorreu em agosto, que aprovou documentos já com oposição ao “Future-se”. Trazendo a discussão para a atuação local da Apub, explicou a estratégia do sindicato de trabalhar para formar sólida uma posição de base contra o projeto, através de um conjunto de atividades como participação em debates nas unidades da UFBA, promoção de encontros de estudo e formação e também articulação com as entidades que representam todos os setores da comunidade universitária, inclusive trabalhadores e trabalhadoras terceirizados/as. Relatou como esta articulação construiu os atos do dia 26 de setembro, quando os quatro setores da UFBA aprovaram coletivamente o não ao “Future-se” em Plenária e carta unificada. Apresentou ainda o núcleo inviolável de princípios a serem defendidos: manutenção do pacto constitucional, da gestão dos recursos e preservação da unidade do sistema das IFES. “E a palavra de ordem básica é a recomposição imediata do orçamento da Universidade, porque o governo produziu uma dificuldade para vender uma falsa solução”. Em relação aos desafios que se apresentam, apontou para a retomada do debate sobre concepção de universidade, para a unificação de forças e construção de convergências, bem como para uma comunicação mais aproximada com a população, que nem sempre tem a Universidade no seu horizonte. Como exemplo, exibiu o vídeo do evento “Universidade na Praça”, realizado pela Apub em agosto.

A diretora da UNE, Júlia Aguiar começou sua exposição saudando a mesa, unicamente formada por mulheres e destacando seu lugar como mulher jovem no debate sobre a conjuntura. Ela fez um resgate histórico dos processos de formação da sociedade brasileira, nos quais o racismo, o patriarcado, as desigualdades sociais e regionais e a existência de uma elite que se antecipa em impedir qualquer tentativa de transformação social são marcas fundamentais que se expressam também no debate sobre educação. Este, segundo ela, esteve sempre marcado pela dicotomia público x privado e disputas que vão de concepções pedagógicas a acesso e permanência. Essas disputas se expressaram nos últimos anos através de projetos antagônicos – neoliberalismo e neodesenvolvimentismo – que dominaram a cena política do país nos anos após a redemocratização. Esse processo foi interrompido com o golpe de 2016 e a aprovação da Emenda Constitucional 95, que ao implantar um teto para os gastos públicos, contribui para a asfixia do setor da educação. “Com todos esses cortes, eles nos apresentam, a toque de caixa, um remédio para estancar um problema que a própria lógica deles criou. O ‘Future-se’ toca no debate da autonomia universitária e também no debate da financeirização”, disse Julia e completou afirmando que “a proposta é grave porque responde ao mercado financeiro e ao conservadorismo. Porque Bolsonaro sabe que é nas universidades onde a gente mais consegue construir resistência”. Embora tenha destacado a relevância das manifestações de maio em defesa da educação, ela afirmou que é preciso ir além das ruas e apresentar e discutir projetos junto à sociedade.

Ao finalizar as exposições da mesa, a professora Luciene Fernandes lembrou que o que tem acontecido no Brasil é parte de um processo que envolve disputas geopolíticas internacionais. A Universidade Pública e o movimento sindical tem sido alvos de ataques, sendo identificados como inimigos pelos que no momento ocupam posições de poder. O início de transformação experimento nas últimas décadas, quando projetos como o Reuni, a lei das cotas e o PNAES conseguiram aumentar a diversidade dentro das Universidades está agora sob ameaça com a imposição de reformas que facilitam o desvio de verbas públicas para fundos privados. O “Future-se” se insere nessa lógica. “Esse não é um projeto de educação, é um projeto de financiamento”, alertou Luciene. “Hoje, permanecer com as universidades de portas abertas é um ato de resistência”. Ao falar sobre o papel do movimento sindical nesse cenário, ela defendeu a incorporação de pautas como o feminismo, o combate ao racismo e LGBTfobia, para que todos e todas possam se sentir representados/as. Ainda, que a busca pela construção da unidade e articulação tem sido realizada pelo PROIFES, que participa de entidades como o Fórum Nacional Popular da Educação e Internacional da Educação, mas precisa envolver também setores da pesquisa científica e ciência e tecnologia, que tem sido atacados e são fundamentais para a defesa da soberania do país. Apontou também algumas iniciativas para ampliar as formas de luta, como o evento “Universidade na Praça” e a ação, em parceria com o Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB, de atendimento em saúde mental a atingidos e atingidas pelo rompimento da barragem do Quati. “A Apub ajudou na criação de um grupo de saúde mental que tem articulação com o MAB para fazer um trabalho lá, mostrando para as pessoas que a universidade não é só para quem está dentro dos seus muros, é patrimônio da sociedade brasileira”. Disse ainda que o PROIFES, em seu Encontro Nacional já se colocou contra o “Future-se” e que o Seminário é fundamental para discutir quais são alternativas, congregar pessoas e apontar novos rumos. “E temos que continuar com o tsunami da educação. Se querem nos fazer cair, vamos mostrar que nós somos resistência: viva a universidade, viva a universidade pública!”.

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