APUB SINDICATO DOS PROFESSORES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR DA BAHIA

De mãos dadas com a democracia, pela universidade e por direitos

Sônia Ogiba: “É o direito à educação que vem sendo violado no país”

Nesta entrevista, a professora Sônia Ogiba faz uma análise dos impactos da Emenda Constitucional 95 e do redesenho das políticas educacionais no cumprimento do PNE, cinco anos depois de sua aprovação.

Estudo realizado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação aponta que 80% das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) estão estagnadas e que todas serão afetadas se o governo mantiver o contingenciamento dos recursos do MEC. Nesta entrevista, a professora Sônia Ogiba, coordenadora estadual da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), faz uma análise dos impactos da Emenda Constitucional 95 e do redesenho das políticas educacionais no cumprimento do PNE, cinco anos depois de sua aprovação. A professora da FACED participará do Seminário Presente e Futuro das Universidades e Institutos Federais, promovido pelo PROIFES-Federação e ADUFRGS-Sindical, no tema PNE – Avanços e Recuos.

PORTAL ADVERSO – Qual é a situação do PNE hoje? Quais metas foram cumpridas? Quais ainda podem ser atingidas? Quais já foram inviabilizadas? Qual o principal obstáculo à execução das metas?

SÔNIA OGIBA – Dia 25 de junho desse ano, a lei 13005/2014, que aprovou o novo Plano Nacional de Educação (PNE), completa cinco anos de vigência, e as perspectivas do cumprimento da maioria das metas está sob forte ameaça. A aprovação da Emenda Constitucional 95 alterou a Constituição para que o novo Regime Fiscal sobre o teto dos gastos públicos fosse implantado e congelou por duas décadas os recursos destinados às áreas da educação e da saúde, trouxe sérias consequências ao cumprimento das 20 metas do PNE e, por efeito, para os Planos dos diferentes estados, Distrito Federal e dos 485 municípios do Rio Grande do Sul. 

A aprovação na Câmara e no Senado da PEC 55 pode ser tomada como uma grave afronta à história das políticas sociais brasileiras, conforme apontaram várias entidades no campo da Educação, particularmente a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais em Educação (ANFOPE), a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (ANPED e o Fórum Nacional de Diretores de Faculdades, Centros de Educação e equivalentes das Universidades Públicas (FORUMDIR), dentre várias outras entidades do campo educacional.

Corremos um sério risco de o Plano ficar inviabilizado, com enormes prejuízos à melhoria da qualidade da educação básica em suas diferentes etapas e modalidades, bem como para o Ensino Superior. Com isto, é o direito à educação que vem sendo violado no país. Um contingente enorme de crianças e jovens deixarão de ter acesso a um ensino que lhes garanta qualidade em suas aprendizagens, conforme previsto na Lei do PNE. Se a meta 20, que destina à educação 10% do PIB até 2024, não for respeitada até o quinto ano de sua vigência, portanto, até 2019, vislumbra-se um panorama de extrema violência contra a educação. Com isto, não teremos atendimento às necessidades de expansão, com padrão de qualidade e equidade, conforme preconiza o Artigo 2º da Lei 13005/2016. 

A comunidade educacional, professores, estudantes e famílias, na sua maioria, sabem da gravidade da situação. É parte do compromisso ético-político de qualquer professor, gestor, famílias, enfim, de todos os cidadãos, acompanharem atentos à implementação do PNE e os processos de avaliação das 20 metas. 

O redesenho das políticas educacionais pelas novas forças políticas que passam a assumir o país mostra que as perspectivas para esse PNE, assim como para as Instituições Educacionais – da Escola Básica às Instituições de Educação Superior – é incerta. Contudo, podemos afirmar que há movimentos de luta na defesa das liberdades de aprender e de ensinar, sem as quais não poderemos dizer que haverá Educação (grifo) nas nossas Escolas e Instituições de Educação Superior, e sim doutrinação e formação para uma “cidadania” voltada para os interesses do mercado e do capital internacional. Lembramos que os Planos em Educação têm um estatuto fundamental que é o de serem planos de Estado, portanto, expressam responsabilidades de uma sociedade para com a justiça social, democracia e para com a cidadania, em vista da contribuição na eliminação das desigualdades sociais e na promoção da equidade.

Como este é um Plano que foi construído de maneira orgânica, estratégica, todas as suas 20 metas estão profundamente articuladas. Então, fica evidente que se não houver investimento por parte do poder público, ou seja, do Estado, investimentos tanto na direção do financiamento quanto no interesse em elevar a qualidade do projeto de educação pública das crianças, jovens e adolescentes de nosso País, qualquer avaliação sobre o atendimento de suas 20 metas, evidenciará o quadro de inviabilização a que o mesmo está sendo submetido. Essa é a situação que se apresenta nesses cinco primeiros anos de vigência do PNE.

PORTAL ADVERSO – Durante audiência na Comissão de Educação da Câmara Federal, o ministro Abraham Weintraub disse que, entre as diretrizes do governo Bolsonaro para a educação, estão: “gestão técnica orientada à entrega de resultados” e “construção de um sistema de educação nacional orientado para o mérito e pelo mérito”.  Na sua avaliação, que impacto isso poderá ter na educação pública brasileira?

SÔNIA OGIBA – Muito já foi dito nos últimos anos sobre a assunção da Meritocracia no magistério. Apontou-se o equivoco de políticas de promoção pelo mérito como desencadeador de uma competição exacerbada em qualquer profissão ou oficio, no magistério não seria diferente. O Sistema Nacional de Educação, que está previsto na Meta 19 da Lei do PNE, certamente não foi projetado nessa direção. A meta diz: “Assegurar condições, no prazo de 2 (dois) anos, para a efetivação da gestão democrática da educação, associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade escolar, no âmbito das escolas públicas, prevendo recursos e apoio técnico da União para tanto”. 

Será uma leitura outra essa do senhor ministro da Educação ao associar “gestão técnica orientada à entrega de resultados” com a “construção de um sistema de educação nacional orientado para o mérito e pelo mérito”. O foco estratégico, e conceitual, presente na Meta 19 é a gestão democrática da educação. 

Como princípio constitucional, Art. 206º, a gestão democrática é um componente estruturante da e na organização do Sistema Nacional de Educação. Qualquer entendimento no sentido de orientar o Sistema Nacional de Educação para o mérito e pelo mérito, que não leve em conta uma ampla participação da comunidade escolar, professores, gestores, estudantes, instâncias de negociação, conferencias de educação e quaisquer outros instrumentos e processos democráticos de participação, trará como consequências a fragmentação, a divisão mesmo, entre os profissionais da educação, gestores e escolas.

Será fundamental, no contexto da Meta 19, um Sistema Nacional de Educação que garanta as condições nas quais professores e gestores exerçam seu trabalho e cargos, e formulem seus projetos político-pedagógicos em regime de colaboração com pais e alunos. O propugnado na Lei 13005/2014, do PNE, cuja vigência será até o ano de 2024, caminha nessa direção.

Fonte: Portal Adverso

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