A pandemia do novo Coronavírus trouxe à tona, entre suas várias facetas, o aprofundamento das desigualdades econômicas e sociais. Os números não mentem: em 2020, o mundo terminou com 56 milhões de pessoas com riqueza superior a US$ 1 milhão, aumento de 10% em relação ao ano anterior.
Mas um estudo do banco Credit Suisse revela que, no Brasil, o número de ricos caiu. Por outro lado, a desigualdade aumentou.
Por aqui, segundo o documento, 315 mil pessoas acumulavam mais de US$ 1 milhão em 2019. Já em 2020, esse número caiu para 207 mil. Uma redução de 34%. A justificativa para a queda teria sido a depreciação da moeda brasileira (o dólar vem disparando desde o começo do governo Bolsonaro).
O índice de Gini do Brasil (indicador que mede o grau de concentração de renda) alcançou 89 no fim de 2020. Quanto mais próximo de 100, maior a desigualdade. Em 2010, o índice era de 82,2.
Atualmente, as pessoas mais privilegiadas do Brasil (1% da população) detêm 49,6% da riqueza do país, contra 44,2% no ano 2000 e 40,5% em 2010.
Isso significa que há mais riquezas nas mãos de menos pessoas. Esse aumento da concentração mostra que a pandemia atingiu as camadas menos privilegiadas, enquanto os mais ricos aumentaram a sua fortuna.
Para alguns, a pandemia está sendo muito lucrativa.
Inadimplência
Esse efeito, potencializado pela pandemia, refletiu na educação. Dados da Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) revelam que a inadimplência no ensino superior subiu 75% entre abril e maio do ano passado. Projetado, isso poderia representar o abandono de 42% dos estudantes das instituições privadas em um futuro próximo.
Embora seja a pior, a pandemia não é a primeira grande crise do século.
A crise econômica que se espalhou pelo mundo a partir dos problemas do sistema financeiro dos Estados Unidos, em 2008 (mas que afetou bem menos o Brasil, que estava vivendo o maior crescimento econômico em décadas) mostrou que a falta de políticas públicas, em alguns países, coloca em risco a subsistência das pessoas.
Por lá, praticamente não existe gratuidade no ensino superior (mesmo as universidades públicas cobram anuidade), e mais de 3 milhões de pessoas possuem dívidas estudantis superiores a US$ 100 mil (quase R$ 500 mil, em cotação do começo de julho de 2021). Entre 20 e 25% dos norte-americanos com mais de 50 anos têm pendências por causa de financiamentos educacionais. O quadro, que já era crítico, piorou ainda mais.
Tanto a situação dos brasileiros inadimplentes como o exemplo dos Estado Unidos nos mostram a necessidade de nosso país ampliar o investimento para fortalecer as universidades públicas.
A importância delas para a sociedade é indiscutível. As universidades e os institutos federais constituem o maior sistema de formação de recursos humanos, produção de conhecimento, desenvolvimento tecnológico, prestação de serviços à sociedade e promoção da cidadania do país.
Junto com as universidades estaduais, elas respondem por mais da metade dos cursos e dos alunos de mestrado e doutorado do Brasil (embora sejam apenas 11,58% do total de instituições) e produzem cerca de 90% da ciência nacional.
Além disso, têm um papel fundamental na inclusão das populações desfavorecidas. Um estudo da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) mostrou que 66,19% dos estudantes de universidades e dos institutos federais têm origem em famílias com renda média de 1,5 salário-mínimo.
Vagas
A falta de vagas no sistema público reflete em vários outros problemas. Além das dificuldades que muitos estudantes têm para arcar com os custos de uma instituição privada de ensino, muitas operam sem garantir uma formação de qualidade. Além disso, há muitos casos de estudantes que não conseguiram sequer se formar porque estudavam em instituições que fecharam as portas, outras promoveram demissão em massa de professores ou reduziram salários e carga horária e não conseguem ofertar as disciplinas. Fora os casos de cobranças indevidas ou perdas repentinas de descontos e bolsas do Fies e Prouni.
Por isso, a ampliação do número de vagas nas universidades públicas é uma necessidade urgente.
Com um número reduzido de oportunidades, a possibilidade de um jovem que trilhou o estudo público desde a base é muito pequena. Ainda que a política de cotas traga um alento a essa situação, não é o suficiente.
Sem a possibilidade de ingressar na universidade pública e sem condições de pagar uma particular, o jovem das camadas menos abastadas do país fica em uma sinuca de bico: ou enfrenta o mercado do jeito que dá na tentativa de bancar um estudo particular, ou desiste de estudar.
Ainda há os casos em que o jovem não tem saída: precisa trabalhar para sobreviver e ajudar a família.
A educação de qualidade, gratuita e universal é uma obrigação do Estado.
Uma necessidade para a construção de uma sociedade cada vez mais justa e menos desigual.
Fonte: APUB