“A Apub não pode ser subordinada a decisões de cima para baixo”

Data

Professor Joviniano S. de Carvalho Neto
Gestões: 1983 – 1985 | 2000-2002 | 2006 – 2008

A primeira pergunta é: por que a Apub precisa continuar a ser um sindicato autônomo, independente e de base? 

O sindicato autônomo, independente e de base é aquele que melhor pode garantir a autonomia e a representatividade da Apub. A função da Apub é representar eficazmente a sua base, os seus professores. A Apub participa do movimento nacional, propondo, tentando influir, mas não pode ser subordinada a decisões de cima para baixo. A Apub participa do Movimento Docente Nacional, encaminhando propostas, procurando influir, mas não pode se subordinar a decisões impostas de cima para baixo.

Então, por que a Apub deve continuar filiada ao Proifes? 

Por dois motivos. Um local para um sindicato de base e autônomo é uma federação. O fato do PROIFES ser uma federação, que reconhece toda a autonomia e atuação do sindicato de base, o torna um espaço mais adequado para a atuação da Apub. Segundo, é que nós tivemos uma experiência traumática, difícil, de convívio dentro do ANDES, na medida que o ANDES foi se fechando, dificultando espaços para exercer o pluralismo da democracia.

As diferenças entre a Apub e a linha geral do ANDES são antigas. Em 1981, quando foi criado o ANDES, a posição da Apub já era a defesa que o ANDES deveria ser uma federação, como era a Fasubra, no qual a ASSUFBA daqui está afiliada. No fim, venceu a teoria de um sindicato sui generis, onde cada Associação Docente (AD), que era a seção docente, não era o sindicato ainda, mantinha patrimônio próprio, CNPJ próprio, capacidade de eleger seus dirigentes e a capacidade de elaborar seu estatuto para ser chamado de regimento e até desfiliar. O ANDES era uma grande frente que reunia vários setores democráticos no fim da ditadura. 

Esse sistema, que era uma grande coalizão, funcionou sem grandes traumas até 1998. Em 1998, as eleições para a diretoria do ANDES são diretas. A oposição ganhou e aí abriu-se um conflito, uma dissidência naquela grande frente, que levou à divisão e que permaneceu durante muito tempo. Quando o grupo que tinha perdido retomou a direção, ele passou a uma postura de exclusão, ou limitação, até satanização do adversário. Esse conflito se agravou. E, nos congressos, as posições divergentes, diferentes, da linha majoritária, não tinham espaço nenhum. Por exemplo, a questão das cotas. A Apub defendeu a introdução das cotas, o nosso diretor cultural, no congresso do ANDES, defendeu as cotas, mas desceu a diretoria inteira para derrotá-las. 

A diretoria do ANDES? 

Do ANDES e do congresso também, porque no congresso não passava nada que a diretoria não quisesse. 

Houve momentos de divergência profunda. Por exemplo, a posição da Apub, após acompanhar a discussão em todas as congregações, colocar jornal com posição a favor e contra, foi apoiar o REUNI, desde que acompanhado e com ressalvas. O ANDES na Bahia, como no Brasil, apoiou e até financiou o movimento de estudantes contra o REUNI. No final das contas, o que aconteceu? A aprovação do REUNI aconteceu com grande resistência, com a invasão da reitoria e oposição, apesar do debate nas escolas, nas congregações e na assembleia da Apub, da assembleia geral ter apoiado o REUNI, desde que com ressalvas de acompanhamento que nós fizemos. Esse, inclusive, foi um ponto de conflito que levou a Apub suspender o repasse financeiro ao ANDES, ainda na perspectiva que depois as coisas talvez se recuperassem. Não se recuperaram. 

O ANDES passou a assumir uma postura de reação a tudo que não fosse um projeto concreto, onde o ótimo é inimigo do bom. O certo não eram cotas, o certo era melhorar realmente o ensino básico e secundário para não precisar de cota. Mas se não fizesse isso, não ia ter cotas, né? Tem uma frase que eu usei, inclusive num debate em 2002, que é o seguinte: é verdade que a questão das cotas é a ponta do iceberg. Mas embaixo da ponta do iceberg tem um iceberg “desse tamanho”. O ANDES, numa postura, houve propostas de reforma da universidade do governo Lula. A Veja atacou pela direita, dizendo que era uma proposta bolchevique, porque implicava em algum controle dos professores, dos conselhos de professores, sobre as universidades particulares. O ANDES atacou pela esquerda, porque não correspondia ao projeto da universidade popular que ela desejava, que era uma proposta até muito boa. Conclusão na época, a Apub sugeriu emendas para melhorar o texto encaminhado através de deputadas ligado à esquerda. A posição do ANDES foi de rejeição total. 

O que não quer dizer que muitos companheiros do ANDES não sejam bem intencionados. Eles querem a universidade pública, gratuita, qualidade, socialmente referenciada? Querem. Eles querem garantir melhores salários? Querem. Mas se rejeita tudo que não foi de acordo com o que foi previamente estabelecido na proposta de universidade do ANDES que é de 2002. A questão das cotas, a questão da reforma universitária, a questão do REUNI foram todos  momentos de divisão. 

Num Congresso do ANDES no Paraná, houve uma divergência entre o ANDES e algumas ADs de oposição, que era do quanto se pagava para o ANDES. Alguns sindicatos pagavam um percentual sobre o vencimento básico e outros pagavam, como eu defendi, sobre remuneração total. A Apub não tinha problema, porque já tinha implantado nossa mensalidade sobre a remuneração. Outros sindicatos insistiam sobre o vencimento básico. Conclusão: o ANDES vetou a entrada do delegado deste sindicato no Congresso. E eles entraram no Congresso com base na liminar da justiça. A divergência em relação ao critério de pagamento de mensalidade, segundo a justiça, não podia ser motivo de exclusão de delegado. Quando o pessoal entrou, a Apub entrou, foi uma vaia, uma esculhambação, um ataque, passamos o tempo todo sendo hostilizados.

Aí eu cheguei e falei: “Eu não quero fazer aqui papel de Cassandra” – Cassandra, a princesa troiana, a quem os deuses deram o poder da profecia. Mas como ela ficou muito metida a besta, ela ficou muito convencida, deram a maldição dela não ser acreditada – “Eu espero não estar fazendo aqui o papel da maldição de Cassandra. Se vocês continuarem atacando tanto, satanizando tanto, vocês vão acabar tirando eles daqui, expulsando eles daqui. E você pode não gostar de fulano, de sicrano, mas se a base dele continuar elegendo e indicando ele, você vai ter que respeitar”. Isso aconteceu. O Gil era o “cão de calçolão”. Mas o pessoal de São Carlos votava nele, passou mais de vinte anos botando no grupo dele. Como é que você faz?


Qual o legado da sua gestão? 

Olha, eu acompanho a história da Apub desde a criação, em 68. Minha primeira presidência como diretor da Apub foi em 1983. Nesses últimos 40 anos, eu já participei de oito diretorias da Apub que, somadas, dão 16 anos. Meu legado principal é ter contribuído para se implantar as características que definiram o padrão de atuação para a Apub, que permanece até hoje. O primeiro é a defesa da democracia na sociedade e na universidade. O segundo, a defesa da universidade pública, gratuita e de qualidade. O terceiro, a defesa de melhores condições de trabalho e remuneração para os professores. E o quarto, a Apub como espaço de reunião no qual os professores ativos e aposentados de qualquer que seja a unidade se encontram como professores, consolidando a sua identidade. 

Para cada um desses pilares que são a base da Apub, há coisas que eu ajudei a fazer, coisas até que protagonizei. Em relação à defesa da democracia, a Apub tem uma contribuição na luta contra a ditadura militar. Uma luta contra o autoritarismo, as várias formas de autoritarismo, inclusive a última contra o autoritarismo que o governo Bolsonaro tentou impor ao Brasil. 

Em termos de democracia na universidade, eu, inclusive na minha primeira gestão, coordenei a primeira consulta pela eleição de reitor e, diga-se de passagem, a Apub tem participado de todas as outras comissões eleitorais para reitor, garantindo um perfil de isenção, de respeito à regra democrática. Também na minha primeira gestão, introduzimos na universidade, com sucesso, a eleição dos diretores das unidades. Se tornou uma tradição. Também introduzimos a participação dos representantes docentes no Conselho Universitário e no Conselho de Curadores. Em relação à democratização da universidade, deve-se levar em conta também a defesa que a Apub fez, da qual eu participei, da defesa das cotas e da ampliação e interiorização da universidade. 

Pensando em termos de democratização no movimento docente, nós defendemos sempre a posição de respeito às oposições, de participação, de tratar todos os filiados do sindicato como colegas. E garantir espaço, não só pela atuação, inclusive, para ativos e aposentados. Foi na minha primeira gestão como Diretor Social de Aposentados que foi criada a Comissão de Aposentados, aberta e autônoma. 

Em relação às condições e remuneração de trabalho, nós defendemos sempre mais verbas para a universidade. A luta por carreira, promoção, atividades, sempre foi a ideia de valorizar. Uma coisa que é marca da nossa atuação é valorizar o trabalho dos professores e a produção que a universidade faz com a sociedade. Quando você divulga um trabalho feito pelo professor, você está mostrando a importância da universidade. A Apub como espaço de encontro, a promoção dos encontros de aposentados, o Forró da Apub, o dia do professor, e a abertura da Apub para o convívio do dia a dia marcam a Apub como um auxiliar fundamental para a construção da identidade do professor.