APUB SINDICATO DOS PROFESSORES DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR DA BAHIA

De mãos dadas com a democracia, pela universidade e por direitos

“A política docente precisa de pessoas comuns”

Data

Professora Raquel Nery

Gestão: 2018-2020

Por que a Apub precisa continuar a ser um sindicato autônomo, independente e de base?

Veja, no caso da Apub, especificamente, para responder estas perguntas primeiro precisamos olhar a história, né? A história de como o sindicato nasceu, de como ele cresceu, saiu da clandestinidade. Que teve um tempo que todo o movimento partidário, que não fosse aquele tutelado e autorizado pelo governo…no fim das contas, quando a gente tem uma carta sindical é também uma forma de tutela do estado.

A gente não pode esquecer isso. Essa ideia de legalidade, é o reconhecimento do estado. E eu acho que, por princípio, os trabalhadores quando se organizam, eles não necessariamente precisam da tutela do estado. Não é isso que dá a sua validade política. Mas é uma validade burocrática. É aquilo que a gente chama de legalidade. Então, considerando a história do sindicalismo brasileiro, mais recente, a história da nossa democracia depois do período da ditadura militar, os sindicatos, de uma maneira geral, tiveram um papel super importante nesse processo. A Apub também. E todo o sindicalismo, toda a representação de trabalhadores, nasce na base! Nunca é um movimento vertical, ainda que a gente precise da tutela do Estado, da resposta do estado, do reconhecimento do Ministério do trabalho, para uma carta sindical. Na verdade, a validade e a legitimidade política da organização dos trabalhadores nasce da base. Então acho que esse é o primeiro ponto. Todo o sindicalismo que é politicamente relevante, ele se estrutura na sua base ou nas suas bases.

O segundo ponto é que, quando a gente continua olhando para a história dos da Apub e do sindicalismo, e do movimento docente brasileiro, a gente sabe que houve um tempo em que foi necessário que todos se unissem por uma causa maior, né? Esse momento é o momento que teve uma repercussão burocrática na concepção de organização, foi o momento em que os sindicatos das suas bases compreenderam que poderiam/deveriam delegar a sua autonomia para uma para uma gestão mais centralizada, considerando o tamanho do desafio naquele momento, que era o processo da redemocratização. Estávamos ali na década de 80, e os mais antigos diziam que era um entulho autoritário. E que ele precisava ser removido e que isso deveria ser feito por uma organização sindical, mais fortalecida e centralizada. E isso aconteceu e funcionou muito bem durante um tempo, né? Com o devido histórico, e novos acontecimentos no movimento docente e na própria política brasileira, a gente começa a ter algumas dificuldades. Porque esse processo de gestão do movimento docente, o movimento sindical dos professores federais centralizada começou a mostrar uma certa rigidez que aparecia nos momentos das eleições, nas definições das pautas, nas formas de luta. E aquilo que era decidido nessa gestão centralizada já não repercutia no que a base compreendia que deveria acontecer, isso já nos anos 2000, no momento em que a gente tem o primeiro mandato do Presidente Lula. Os processos de negociação que passaram a acontecer dali eram tratados com uma certa rigidez desse sindicato nacional do qual a Apub fazia parte.

Na verdade, naquele momento, a esquerda já tinham se separado, já estava dividida. E havia em todo o Brasil outros professores que viveram esse tempo que não eu, que já davam sinais indicativos de que a tendência seria se afastar, se descolar dessa entidade nacional centralizada, que continua assim até hoje, inclusive. E retomar as suas características iniciais como sindicatos organizados na base. Isso significa o que nos dias de hoje? É a gente perceber que, mesmo que estejamos aqui na Bahia (nas universidades baianas) como um sindicato de base, a nossa categoria é uma categoria federal. Então, ela vai precisar de outras articulações nas instâncias nacionais, então isso vai acontecer, por exemplo, com outros sindicatos de base; e com a nossa democracia é representativa temos representantes em instâncias como o Fórum Nacional de Educação; também operamos conjuntamente com o Observatório do conhecimento; se organiza em razão de questões previdenciárias, isso diz respeito ao nosso fundo específico de previdência suplementar ou complementar, que é o Funpresp. Pra fazer isso a gente não faz sozinho, precisamos estar articulados, mas a gente se articula sem perder a nossa autonomia. Porque há coisas que acontecem só na Bahia, diferente de coisas que acontecem em Alagoas, em Minas Gerais, no Paraná e por aí vai.

Então, ser um sindicato de base não significa que a gente abra mão da articulação nacional, significa que a gente tem mais autonomia para os nossos processos de tomada de decisão, em nossos processos de representação, nos lugares onde nós queremos estar representados e onde queremos trabalhar e incidir, nas ações que fazemos também na nossa base. Um exemplo, acho que muito claro disso, foi em 2019, (eu estou falando deste lugar porque eu era presidente da Apub) criamos um evento muito interessante que foi o “Universidade na praça”. Que foi algo que nenhum sindicato fazia, mas a gente entendeu que naquele momento de crescimento do governo Bolsonaro, o Ministério da Educação era violento, atacando as universidades não apenas do ponto de vista orçamentário, mas simbólico também. A gente disse: “Não!  Vamos conversar com a sociedade”. Porque para a sociedade também que o Abraham Weintraub (ex-ministro da educação) naquele momento estava jogando. E para realizar um evento daquele, com aquelas características, só um sindicato de base que toma suas decisões baseados ou tendo por referência aquilo que está acontecendo na base. E já havíamos, antes do “Universidade na praça”, acho que no mês de maio, um evento super importante, na verdade um conjunto  de mobilizações que a gente gosta de chamar de “Jornadas de maio”, que foi uma coisa que nasceu aqui na Faculdade de Educação. A gente teve uma plenária que se juntou com os estudantes e a gente saiu, era uma segunda, e atravessamos, fechamos essa rua e subimos até a reitoria. E naquele evento, junto com outro evento que aconteceu no colégio D. Pedro Segundo, no Rio de Janeiro e esses 2 eventos foram estopins de um movimento muito amplo em todo o Brasil, pela universidade pública, pela educação pública, com a participação não apenas dos professores organizados em seus sindicatos, mas também e principalmente dos estudantes. Eles tiveram um papel fundamental, estruturante para esse evento. Então, assim, quando a gente então fala sobre as formas de luta, sobre onde a gente quer incidir politicamente, as formas dessa incidência, as ênfases que a gente dá às nossas pautas, fazemos isso a partir de um sindicalismo que está enraizado na sua base e que não está de uma maneira muito dependente de um grupo político, que inclusive não é um grupo. Se pelo menos houvesse um pluralismo político, mas é uma coisa muito centralizada, ideologicamente também muito fechada, há pouco espaço para a movimentação. Então, na minha compreensão, até a própria complexidade da pluralidade dessa base, do que são os professores das universidades, que são pessoas normais. Acho que isso é uma coisa também muito que queria te dizer, eu sou uma professora normal. O que é que eu estou chamando de um professor normal? É um professor que tem a democracia como princípio, que compreende o papel, a função da sua profissão no desenvolvimento do país, na formação das pessoas. E um professor que, acima de tudo, valoriza a democracia. E não existe democracia sem pluralismo político, sem respeito à autoridade, ao pensamento divergente dentro dos limites da própria democracia. Que é a democracia que, de vez em quando, ela mesma se torna vulnerável àquilo que a ataca. No fim das contas, é o que estamos fazendo, nós elegemos um cara autoritário em 2018. Então, ser um sindicato de base e autônomo diz respeito a essa legitimidade que é a política real, a política que considera a pluralidade, a complexidade do movimento docente nasce na base.

Por que a APUB deve continuar filiada ao PROIFES? 

Uma coisa importante a se pontuar é que quando o Proifes nasce, ele não é o primeiro movimento, ele é um movimento derivado de um outro, que é essa insatisfação e percepção de que alguma coisa muito errada estava acontecendo no processo como um todo. E volto a dizer, um processo politicamente centralizado que não estava dando conta de repercutir a complexidade e a pluralidade das posições políticas naquele momento. Então você tem um movimento crítico de descolamento dos sindicatos, de vários sindicatos, não foi só a APUB, que vão aos poucos se descolando desse sindicatão nacional que tinha ficado rígido, não dava mais conta de representar a complexidade daquele momento de ter um governo trabalhista. Naquele momento era um era um presidente trabalhista, havia possibilidade, era uma janela histórica, era uma conjuntura em que a gente podia tirar o melhor proveito daquilo. Mas algumas amarras ideológicas impediram isso de acontecer. Então, alguns sindicatos foram se descolando, dizendo: ‘A gente não quer mais’. E aí esses sindicatos, em suas assembleias, nas suas instâncias de deliberação, decidiram se descolar do ANDES, que foi o que aconteceu com a Apub no ano de 2009, com plebiscito que aconteceu no mês de junho, que vai estar fazendo 15 anos isso. Essa discussão, ela vem agora, ela está sempre vindo porque isso é da política, é do jogo político. Esse movimento veio através dessas instâncias deliberativas e ela é resultado de uma coisa que antecede e que é o limite dessa organização centralizada no sindicatão ter chegado ao seu limite. Ela não conseguia mais responder.

Então esses sindicatos começaram a se descolar. Mas como é que a gente vai se organizar, já que ninguém vai fazer isso sozinho?

Se você observar as mesas de negociação que foram reabertas com o início do governo Lula, através dos seus representantes, o MGI e o MEC, se relacionaram com as categorias através de fóruns. E esses fóruns, o FONASEFE, que a Apub fez parte enquanto filiada ao Proifes e o FONACATE, que é o Fórum das Carreiras Típicas de Estado. Então o governo lidou com esses fóruns, porque esses fóruns cuidam de uma instância intermediária de organização. Então o governo não lida com as bases diretamente. Essa é uma forma de organização da própria democracia representativa. Você tem instâncias de representação. Eu tô falando da Mesa Geral, a mesa permanente de negociação. Quando ela se desdobrou e veio para a mesa específica, aí o governo passou a tratar diretamente com as categorias. Quando chegou no campo da Educação, ele chamou, não o Rio Grande do Sul, que é um sindicato que tem sua própria carta sindical, não chamou Goiás, não chamou Rio Grande do Norte, Santa Catarina. Ele chamou a entidade que representava junto com outro sindicato, que era um sindicato nacional, que a partir daquele momento, depois de outras situações em que já existiu, o ANDES não reclamou. Mas desta vez ele não apenas reclamou, requereu para si a posse da representação docente. ‘Nós somos os únicos, os legítimos representantes’.

Eles judicializaram, né? E no primeiro momento que eles fizeram isso, e eu estava lá, eu testemunhei, qual foi a reação do governo? O governo disse: ‘Se eu for acatar esse pedido de vocês, primeiro lugar, a gente vai suspender essa reunião aqui. Segundo lugar, eu vou ter que tratar separadamente. Porque tem um conjunto de sindicatos que vocês, ANDES, não representam. O que eu vou fazer com eles?’ O que que eu estou querendo dizer com isso? Que não há incompatibilidade entre você ter uma instância de representação como uma federação e ser um sindicato de base. Você está fazendo sua política nacional sem perder suas características, o seu enraizamento na base. Essas características são essas que eu já falei que não preciso repetir.

Então estar numa federação é fazer a política no âmbito nacional, naquilo que interessa, e o Proifes tem demonstrado a capacidade de fazer coisas bastante interessantes por esse viés. É um viés mais dinâmico, principalmente menos centralizado, com uma composição de direção proporcional e significa que todos estão representados nos processos de deliberação e não apenas um grupo político. Eu acho que essa é a coisa mais interessante, que você não tem uma gestão verticalizada, você tem uma gestão horizontal. Eu gosto muito da ideia da mesa redonda. É uma mesa sem cabeceira. Então é muito importante estar articulado nacionalmente com uma organização política, que ao mesmo tempo que faz uma incidência responsável nas instâncias, nos lugares em que ele precisa incidir. E não é só com o governo, há outros atores com quem nós precisamos conversar. Você tem os poderes, o poder judiciário também, o legislativo. Por exemplo, está acontecendo agora um projeto de lei que está querendo tributar os nossos fundos de previdência complementar. A gente vai incidir como? A gente não vai reclamar com o governo. Por quê? Porque o poder é legislativo, tem essa autonomia para fazer essa discussão, a gente vai conversar com eles. Essa é uma instância importante, o próprio executivo no momento das mesas de negociação. Então, esses lugares, essas instâncias, instâncias relacionados ao campo da educação, da ciência e tecnologia. O Proifes está representado hoje na SBPC que está acontecendo em Belém do Pará. Então há outros espaços de representação. O Proifes, agora ela pode, ele é uma federação que pode indicar, fazer indicações para a composição dos conselheiros no conselho nacional da educação. E outras instâncias, outros lugares, outros atores como os movimentos sociais, organizações como Observatório do conhecimento. São instâncias em que o Proifes está de modo horizontal, com suas representações, de modo plural, de modo dinâmico, sem que a gente abra mão da nossa autonomia e da nossa Independência. Eu acho que outra coisa importante também é a questão financeira. Eu publiquei um artigo há alguns dias em que está dito lá que é uma coisa que no fim das contas é sobre dinheiro também, sobre o que se faz com os recursos que cada um de nós que somos associados, filiados, entregamos mensalmente ao nosso sindicato, e aí falaram ‘Ah, mando o dinheiro para o Proifes’ e fizeram, inclusive, estimativas erradas, irresponsáveis. Na verdade, vocês sabiam que a gente envia para o Proifes 9% da arrecadação mensal e que o ANDES cobra 20%? Foi mais que o dobro junto. E junto com esses 20% ainda tem um fundo de greve! Como se o sindicato precisasse ter um recurso adicional para a greve. Como se os recursos que nós recolhemos já não fossem o suficiente. Eles têm um fundo específico para a greve. Com isso eu quero dizer que, do ponto de vista financeiro, nós também temos bastante autonomia. Temos autonomia jurídica nos processos de representação, na representação dos nossos colegas professores junto ao judiciário e no próprio diálogo com os interlocutores políticos. Temos autonomia administrativa na gestão dos nossos bens e dos nossos recursos. Temos, acima de tudo, a autonomia política de conduzir as nossas pautas. Então, essas coisas não são incompatíveis com o conceito de federação. E o conceito de federação é você ter entes autônomos, entes soberanos independentes, conscientes da sua própria identidade, das suas capacidades, dos seus deveres, das suas possibilidades, e eles, conjuntamente com outros entes; se tem um sindicato pequeno e o nossa Apub que tem 2500 filiados e tem um tem um sindicato que tem 100 filiados, ele não é menos importante que o nosso. Ele está levando a representação deles, aí alguém vai dizer: “Ah, mas ele você não vai comparar uma pessoa representando 100 a uma pessoa representando 500”. Que alternativa temos? Então, nas estruturas representativas, se você olhar o cálculo que é feito para o número de senadores, o número de deputados nas casas legislativas, elas também têm uma proporcionalidade. Então, o fato de a Bahia ser um estado que tem demograficamente um volume muito maior do que o estado Sergipe, não significa que Sergipe seja menos importante. Então a gente teria um sindicato que precisaria ter 500 pessoas, 1000 pessoas para ser um sindicato? Quanto tempo isso levaria? Eu acho que a gente tem que pensar de modo a fortalecer o movimento docente e não criar obstáculos para eles. É uma coisa importante ser dita. No momento em que as taxas de sindicalização estão caindo, no momento em que os empregos formais, de pessoas que têm carteira assinada, que tem alguma estabilidade, um conjunto de direitos, esse número que também está caindo, o que é que a gente tem no contraponto a isso? Pessoas que estão criando obstáculos para a organização dos trabalhadores. ‘Ah, não. Aquele grupo ali é de 50 pessoas.’ Ou seja, 50 pessoas não têm o direito de se organizarem? O que é necessário para que as pessoas se organizem, entendeu? Então essas coisas precisam ser discutidas nesse, entende? Fortalecer a organização dos trabalhadores e não fragilizar a organização dos trabalhadores, não criar obstáculos para ela. No momento como esse que a gente está vivendo, não era para as pessoas estarem dizendo que esta entidade, porque o Proifes foi muito combatido, foi um linchamento. As pessoas achavam que tinham por alguma razão a greve deu esse grupo de pessoas, esses militantes, o salvo conduto para fazer um linchamento de uma entidade dizendo que ela não tem legitimidade, que é fantasma, que é fantoche, que é pelega, etc. Por quê? Porque ela tem um tipo de organização que, sim, a autorizou estar lá, sentar na mesa junto com eles. Dizer que a gente assinou e ‘ah, não ouviu a base’? Isso não é verdade. Nós temos, ele (o sindicato) tem uma estrutura, um conjunto de regras estatutárias, a partir de uma maioria interna que diz, nós estamos aqui. E temos legitimidade, temos condição de fazer isso, e foi lá e fez. A Apub não queria greve na assembleia, nós dissemos que não era para fazer. Mas uma assembleia tem que dizer a sua deliberação. A gente recusa. Mas e a outra assembleia? Aqueles outros professores que aceitaram? Não é dessa maneira que nós deliberamos? Não é sempre por maioria? Porque a maioria do Proifes não serve em relação a maioria do outro sindicato nacional? É por uma questão de quantidade? Mas os processos de representação são sempre relativos. Se você observar o número de pessoas que estavam nas assembleias do Proifes e foram ouvidas e tiveram oportunidade de ser ouvidas, inclusive por consulta pública, e não apenas na assembleia, você vai ver que são números aproximados. Então, esses processos de representação são processos relativos. Isso também está escrito, formulado, organizado em outro lugar nesse artigo que acabou sendo publicado, ele ficou muito resumido. Mas esse é um argumento que eu também desenvolvo, os processos de representação são processos relativos. Eles não dizem respeito à maioria ampla. Somos duzentos mil professores no Brasil. Quantos são sindicalizados? Você tem aí pouco mais de 30% de professores sindicalizados. Porém, aquilo que a gente decide em um processo negocial como esse vai pro contracheque de todo mundo. Então a gente precisa fazer um enfrentamento tranquilo, não é ficar desqualificando o outro, como se nós fossemos párias.

Qual você considera ser o principal  legado da sua gestão? 

Poderia dizer que foi ter construído ou realizado Universidade na Praça. Ou também poderia dizer quais foram as contribuições, as formalizações que fizemos naquele momento de afastamento, em que a gente entregou documentos; a gente negociou, cuidou de muitas coisas. Mas eu acho que não é isso. Eu acho que o legado é dizer para as pessoas que qualquer pessoa pode fazer política. Eu acho que essa é a coisa mais importante para a minha vida, porque eu não tenho pretensão política nenhuma. Não pretendo cargos eletivos e tal. E o que vi é que dentro da política, às vezes, eu não estou minimizando ou esvaziando o valor da política institucional, dos partidos, políticos, dos sindicatos. Mas o que eu estou dizendo para você é que nós, professores, no Movimento Docente, todos nós temos legitimidade, capacidade para fazer esse trabalho da política. Até porque a tarefa mais difícil, a que exige mais qualificação para nós, no sentido estrito do termo, de preparação, de formação, é aquilo que fazemos nas salas de aula, na extensão e na pesquisa. Então, não precisamos ser seres especiais, com dotações especiais ou formados em tal e tal instância para fazer a política. A política docente precisa de pessoas comuns. Eu acho que eu sou uma professora comum, uma pessoa como muitas outras que estão ali nos observando. Teve um momento que eu disse assim: ‘Ah, é interessante fazer isso. Eu vou lá ver como é. Porque, no fim das contas, os sindicatos cumprem um papel nas democracias. E a democracia é uma tarefa coletiva, mas ela também requer que algumas pessoas se envolvam de maneira mais intensa. Você não precisa ser a terceira geração de militantes revolucionários ou que lutaram pelos direitos humanos. A sua militância simples, comum, do cotidiano, ela é também válida para fazer esse trabalho. Acho que esse é o principal legado. 

Quem é a professora Raquel? A professora Raquel, foi uma professora que chegou em 2009 na faculdade de educação. Ela estava no movimento estudantil? Não. Ela é de algum partido também? Não. De algum movimento social? Não. O que faz a professora Raquel, então? Ela é professora. Esse é o legado.

Se as pessoas tiverem entendido essa mensagem, eu estou muito satisfeita. Porque é muito ruim quando alguns militantes tomam para si, presumem que têm uma tarefa de tutela intelectual conceitual moral sobre o trabalho político das outras pessoas. Isso é muito ruim para democracia. Muito ruim para tudo. Para luta de gênero, antirracista, LGBTQIA+. Esses conjuntos de valores, de crenças que nos colocam como seres diferentes uns dos outros. Então alguns são mais especiais e, assim, você está autorizada a estar em certo lugar fazendo certas coisas? Absolutamente (não). A luta é pra todos!