A abertura oficial do semestre 2019.2 da Universidade Federal da Bahia aconteceu na noite desta quinta-feira, 08 de agosto, no Salão Nobre da Reitoria, com uma aula inaugural debatendo “Universidade, Democracia e Política”. A atividade, coordenada pela Apub, Assufba e DCE/UFBA, trouxe como convidados o professor Márcio Pochmann (Unicamp), a reitora eleita da UFRB, professora Georgina Gonçalves e o próprio reitor da UFBA, recém-eleito presidente da Andifes, João Carlos Salles. Este foi mais um evento da programação da Semana de Boas-Vindas da Apub.
A necessidade de defender a Universidade Pública e a chamada para a Greve Nacional em Defesa da Educação e da Aposentadoria no próximo dia 13 de agosto pautaram as saudações iniciais das entidades. Representando o DCE, Gustavo Negreiros destacou as atividades de mobilização que estão sendo organizadas pelo Diretório; Renato Jorge (Assufba) convidou para a concentração do dia 13 em frente ao prédio da Reitoria e disse ser preciso dialogar com a população sobre a importância do ensino público e gratuito. A presidenta da Apub, professora Raquel Nery reafirmou que o semestre não se inicia na normalidade e instou à construção da resistência nas mais diversas formas e ações. Ela finalizou lendo o poema “De mãos dadas”, de Carlos Drummond de Andrade.
Pochmann: “A universidade é uma necessidade do povo, da soberania popular, da soberania nacional”
O imperativo de superar a narrativa de que as condições objetivas da realidade estão dadas e resta somente a acomodação e as soluções individuais foi um dos pontos centrais da exposição do professor Márcio Pochmann. Ele exemplificou com as narrativas sobre a inevitabilidade do modelo de globalização que impediria as nações de manterem suas políticas soberanas e sobre como a crescente automatização do mercado de trabalho encolheria as ofertas de emprego. Para ele, essas são questões que guardam semelhanças com outros momentos da história na qual houve mudanças e questionamentos a respeito da organização do trabalho e das forças produtivas, como quando do fim do uso de mão de obra de pessoas negras escravizadas ou durante o movimento tenentista da década de 1930. “Guardadas as devidas proporções, estamos vivendo um momento equivalente. O Brasil do futuro está sendo decidido agora, vínhamos num rumo e agora estamos em outro. Não podemos ficar prisioneiros da narrativa passada de que tudo já está dado, de que não tem espaço a não ser para a uma saída individual. Não tem saída individual”, disse.
Outro ponto trazido pelo professor foi a relação entre a Universidade e a construção de um projeto nacional. O pensamento nesse tipo de projeto não existia antes da década de 1930, quando o Brasil era completamente subordinado a projetos econômicos e determinações externas. É a partir da construção de uma ideia de país – de uma vontade nacional – que as Universidades encontram sentido e justificativa, pois, “formar pessoas, qualificar, produzir conhecimento, para quê senão para as necessidades nacionais?”, questionou. Nesse sentido o atual desmoronamento do sistema de ensino público e da produção de ciência e tecnologia está associado não somente a limitações econômicas mas ao abandono de qualquer projeto de país soberano. De acordo com o professor, o Brasil está “jogando fora toda a construção política, social, econômica e cultural que justificava as inúmeras instituições voltadas para a questão educacional e da ciência e da tecnologia”. Ainda, não será a elite que irá defender o ensino público. “A universidade é uma necessidade do povo, da soberania popular, da soberania nacional. Nada nos afasta do embate, da superação desta elite subordinada sem compromisso com o conjunto da nação”.
João Salles: “A Universidade está apenas em processo de fazer-se”
O reitor da UFBA João Carlos Salles, iniciou saudando a UFBR, ali representada não somente pela reitora eleita Georgina, mas também pelo ex-reitor, Silvio Soglia, que foi chamado a compor a mesa. Ele comentou também o anunciado bloqueio adicional de quase R$ 1 bi em verbas do Ministério da Educação para custear emendas parlamentares cedidas no contexto da votação da Reforma da Previdência. “Esse ato parece querer tornar os parlamentares cúmplices do processo de ataque às universidades públicas”, afirmou. Em seguida, o reitor fez a leitura de um texto seu intitulado “O Futuro da Universidade”, dedicado à Georgina Gonçalves. O ensaio traçou algumas reflexões sobre o constante processo de asfixia financeira das Universidades Públicas; destacou que os contingenciamentos ocorrem desde 2014, deixando incompletos processos de expansão e inclusão. “A Universidade mal cumpriu seu arco, está apenas em processo de fazer-se”. Apontou também alguns riscos oferecidos pelos princípios norteadores do programa “Future-se”, notadamente em relação à mudança de paradigma que eles representam na própria natureza da Universidade e no seu papel como propulsora do desenvolvimento e instrumento de justiça social. “A vida universitária incomoda, tanto pelo conhecimento produzido, quanto pelo desenho democrático e crítico das nossas relações. Não por acaso, portanto, o ataque constante”.
Georgina: “O Ministro tinha medo de olhar nos olhos do Recôncavo”
Reitora eleita com 80% dos votos em consulta à comunidade universitária, a professora Georgina Gonçalves, da UFRB, não teve sua posse efetivada pelo Governo Federal, que nomeou o terceiro colocado na lista tríplice, professor Fábio Josué. Georgina destacou este ato no contexto de ataques à autonomia universitária e apontou algumas das especificidades da UFRB, como uma universidade ainda jovem, situada no interior do Estado. “A UFRB nasce há 14 ano e modifica a paisagem do Recôncavo; construímos um processo rico, onde foi mobilizada a comunidade através dos centros acadêmicos, das associações e sindicatos dos professores e servidores técnicos e conseguimos através de uma consulta considerada informal, mas extremamente legítima, 80% dos votos da nossa comunidade. Isso não foi o bastante para fazer calar aqueles que querem a universidade pública subjugada a seus interesses”, disse.
A reitora destacou a combatividade do Conselho Universitário da UFRB e reafirmou seu apoio ao professor Fábio Josué, reitor empossado, reconhecendo seu compromisso com o projeto da universidade. Destacou, porém, a necessidade de questionar “por que o governo brasileiro não quis nomear uma reitora eleita por sua comunidade, por seu conselho? Não quis reconhecer o que MPF, a justiça federal reconheceram como processo idôneo. Essa pergunta precisa ser respondida por todos nós. O Ministro tinha medo de olhar nos olhos do Recôncavo e encontrar na reitora eleita a figura do Recôncavo combativo”. Por fim, ela declarou que continuará lutando pela Universidade através do exercício da docência. “Eu fiz concurso para professora e vou continuar, junto com a comunidade e com o reitor, defendendo a universidade tal como ela é. Dia 19 de agosto estarei em sala de aula. A universidade foi desejada pelo povo do Recôncavo baiano e não vai ser o capitão que vai nos fazer dar um passo para trás. Continuaremos na batalha, na defesa daquele que é um sonho sonhado por muitos”.
Encerradas as falas, a professora Luciene Fernandes, vice-presidenta do PROIFES-Federação leu uma carta em homenagem à reitora eleita. Estiveram presentes no evento as parlamentares Alice Portugal, Olívia Santana, alem de Hilton Coelho, e também representantes da APLB Sindicato, UNEGRO e Levante Popular da Juventude, que realizou uma performance artística.