Entre os dias 15 e 17 de julho, milhares de delegados/as/es estiveram reunidos/as/es em Natal, no Estado do Rio Grande do Norte, na Etapa Nacional da Conferência Nacional Popular de Educação de 2022 (Conape), acumulando mais debates (desde a Conape de 2018) e ratificando um Documento Referência intitulado “Reconstruir o País: a retomada do Estado democrático de direito e a defesa da educação pública e popular, com gestão pública, gratuita, democrática, laica, inclusiva e de qualidade social para todos/as/es”.
Nos últimos dois anos, por meio das conferências preparatórias (municipais, regionais, intermunicipais, estaduais e distrital) livres e temáticas, o Fórum Nacional Popular de Educação – FNPE (com suas entidades) mobilizou amplos setores da sociedade brasileira, inspirado pelo Patrono da Educação Nacional, Paulo Freire.
Assim o FNPE, associado aos debates processados pela sociedade civil e movimentos sociais, tendo por eixo a aprovação do Documento Final da Conape 2022, convoca a população brasileira, em especial do campo educacional, para, juntos/as/es, reconstruirmos nosso País.
Para isso, propomos a implementação de uma plataforma em defesa do Estado democrático de direito, em defesa das instituições republicanas, da vida e da soberania popular, dos direitos sociais e da educação, que mobilize, ainda mais, amplos setores da sociedade pela:
- revogação da Emenda Constitucional nº 95/2016 e, portanto, pelo fim do congelamento de recursos primários associados ao Poder Executivo e pela retomada dos investimentos na educação e em áreas sociais, com a flexibilização da Lei de Responsabilidade Fiscal;
- revogação da privatização, ocorrida na Petrobrás, Eletrobrás patrimônios naturais e públicos do povo brasileiro, e pelo resgate dos 75% e dos recursos dos 50% dos royalties do petróleo e do Fundo Social do Pré-Sal para o financiamento da educação pública estatal, de gestão pública;
- efetivação de uma reforma tributária fortemente redistributiva e pela implementação da taxação das grandes fortunas;
- auditoria da dívida pública e revogação das demais medidas de ajuste e renúncia fiscal que fragilizam as políticas sociais, principalmente na área educacional, social e da saúde;
- suspensão da tramitação das PECs 13 e 32 e de quaisquer medidas similares que tenham a intenção de estabelecer o fim das vinculações mínimas obrigatórias de recursos, privatizando, terceirizando e retirando direitos dos servidores públicos e, ainda, por uma regulamentação de ICMS que não retire recursos da área da educação e das demais políticas setoriais garantidoras de direitos;
- consolidação das políticas públicas de Estado para a educação pública e popular, com gestão pública, que garanta o acesso, a permanência e a qualidade socialmente referenciadas para toda a população;
- defesa, monitoramento e consolidação do PNE, à luz das deliberações das Conaes de 2010 e de 2014, e das Conapes de 2018 e 2022, como epicentro das políticas públicas educacionais, instrumento fundamental de articulação do SNE;
- regulamentação, democrática, do SNE e da cooperação federativa na educação, por lei complementar;
- efetiva implementação do Fundeb, para a educação pública, de modo robusto e permanente, com a materialização do Custo Aluno-Qualidade (CAQ) como realidade e referência de justiça federativa, aliando qualidade e financiamento, preservando-se fontes orçamentárias e definição de percentuais para pagamento de trabalhadores(as)/profissionais da educação, bem como destinação dos recursos do salário educação exclusivamente aos programas complementares, além de progressiva ampliação da complementação da União, evitando-se a destinação e a aplicação de recursos via políticas meritocráticas ou de vouchers;
- expansão do financiamento público da educação básica e superior e, neste sentido, pelo horizonte de cumprimento da meta 20 de ampliação do investimento público em educação pública como proporção do Produto Interno Bruto (10% do PIB), para o qual, precisamos retomar as condições para o crescimento econômico com justiça distributiva, com a riqueza nacional vinculada a uma sólida destinação de recursos em educação.
- garantia da qualidade social da educação, por meio da construção de padrões de qualidade, processos regulatórios e de avaliação emancipatórios e inclusivos na educação básica e superior, contrapondo-se à atual centralidade conferida à avaliação como medida de resultado e instrumento de controle, ranqueamento, concorrência e competitividade no campo educacional e institucional, assegurando, inclusive, que quaisquer regulamentações da distribuição de recursos públicos por critérios educacionais considerem, com prevalência, critérios de atendimento, inclusão e formação;
- destinação de recursos públicos exclusivamente para as instituições públicas de educação, com acompanhamento dos Conselhos de Controle Social e Popular;
- destinação de recursos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), geridos com efetivo controle social, para garantir plataformas públicas e internet de alta velocidade para todas as instituições de educação básica e superior públicas do País, com garantia de acesso gratuito e formação adequada a todos/as trabalhadores(as)/profissionais da educação e estudantes, especialmente aqueles em situação de vulnerabilidade;
- regulamentação e controle social do ensino privado, sob as mesmas exigências legais e de qualidade socialmente referenciada aplicadas à educação pública e efetivadas sempre com a participação das(os) trabalhadoras(es) do setor;
- suspensão de contratos temporários que impedem a valorização profissional, cerceiam a construção de vínculos com a escola e prejudicam o trabalho pedagógico;
- garantia da implantação do piso salarial profissional nacional e de planos de carreira para os/as trabalhadores(as)/profissionais da educação, das redes pública e privada, sempre vinculada com a promoção de sua necessária valorização, inclusive com fortalecimento de mecanismos de controle social e institucional para que não haja atrasos em pagamentos;
- gestão democrática e autônoma da educação e de suas instituições, reconhecidas sempre como espaços de liberdade e de pensamento crítico, de toda a comunidade (profissionais da educação, de estudantes, de famílias, movimentos sociais), bem como pela valorização dos projetos político-pedagógicos de cada instituição educacional e da necessária relação currículo-docência, que deve sempre afirmar a natureza e o caráter público, gratuito, laico, inclusivo e democrático na escola pública, priorizando, notadamente, o diálogo com as entidades dos/as trabalhadores(as)/profissionais da educação, estudantis, sociais e colegiados das instituições de educação superior;
- gestão democrática da educação nacional, via eleições diretas para dirigentes, em todos os níveis, com decidido fortalecimento de órgãos e processos colegiados inerentes à proposição de políticas e ao controle social da educação, em todas as estruturas educacionais, sempre com efetiva participação cidadã da sociedade civil;
- expansão e fortalecimento da Universidade Pública e institutos públicos de educação, com gestão pública, popular gratuita, laica, inclusiva, democrática, de qualidade socialmente referenciada;
- retomada do processo de expansão e de interiorização da educação superior pública e de qualidade em nosso país, com consolidação de Políticas Afirmativas e de Assistência Estudantil, com recortes étnico-raciais e sociais;
- valorização e garantia de financiamento adequado para a pesquisa, a ciência, tecnologia e a produção do conhecimento;
- expansão dos cursos de formação de professores em universidades públicas e institutos federais de educação, ciência e tecnologia, com garantia de autonomia para a elaboração de seus projetos formativos, reafirmando a necessidade da implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial em Nível Superior e para a Formação Continuada (Resolução CNE CP 02/2015);
- eliminação da pobreza, da miséria, do racismo, do sexismo, da LGBTQIA+fobia, da xenofobia, do capacitismo e todo e qualquer tipo de discriminação, preconceito, violência, intolerância e violação de direitos que devem ser entendidos/as como injustiças sociais a serem superadas, com políticas de Estado e com a afirmação do papel da sociedade civil e da justiça civil em uma perspectiva inclusiva e democrática como fundamental para a resolução da tensão entre diversidade e desigualdade;
- retomada, continuidade, ampliação e fortalecimento de todas as ações, programas e políticas de inclusão, anteriores ao golpe de 2016, que digam respeito às especificidades da educação do e no campo, educação quilombola, educação especial em uma perspectiva inclusiva, educação escolar indígena, educação de pessoas em situação de itinerância, educação de jovens, adultos e idosos, educação de pessoas LGBTQIA+ e educação nas prisões e educação para adolescentes em (ou com) medidas socioeducativas, entre outras, com políticas afirmativas que elevem a condição cidadã desses brasileiros e brasileiras, historicamente marginalizados e cerceados de exercer seu direito constitucional à educação;
- efetivação de políticas educacionais voltadas aos estudantes frente à situação de evasão e abandono crescente, inclusive por aquelas agravadas pelas consequências da Covid-19, e todas as demais decorrentes da ausência de recursos materiais, técnicos e pedagógicos adequados;
- universalização do direito das crianças pequenas à educação infantil (creches e pré-escolas);
- efetiva implementação de leis que representam avanços civilizatórios nas lutas pelos direitos humanos e afirmação das diversidades, tais como as leis que tratam da história e cultura afro-brasileira e indígena e que regulamentam o uso do nome social e o reconhecimento das identidades de gênero de pessoas travestis ou transexuais, entre outras, que precisam ser afirmadas e valorizadas;
- defesa da educação integral, com gestão democrática e inclusão social, assegurando condições de trabalho, valorização profissional e respeito à diversidade, com vistas à formação integral do educando, dando-lhe acesso ao conjunto dos saberes e conhecimentos científicos historicamente produzidos;
- defesa de educação profissional, tecnológica, politécnica e integrada, comprometida com o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para a cidadania e tendo o trabalho como princípio educativo;
- revogação da “Base Nacional Comum Curricular”, e da “Reforma do Ensino Médio”, bem como dos currículos dos entes subnacionais dela decorrentes;
- revogação da atual política nacional de alfabetização e seus desdobramentos;
- revogação das Diretrizes Nacionais para a Formação Inicial de Professores (Resolução CNE/CP Nº 2, de 20 de dezembro de 2019) e das Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação Continuada (Resolução CNE/CP Nº 1, de 27 de outubro de 2020), que estreitam a formação e a tornam tecnicista, desvalorizando os/as profissionais da educação e promovendo o avanço privatista sobre a educação;
De igual modo, para avançarmos em tais agendas, propositivas e afirmativas, para a transformação da educação brasileira e para a expansão de direitos sociais e educacionais, precisaremos nos manter firmes e mobilizados:
- contra todas as formas de desqualificação da educação e de financeirização, privatização, terceirização e transferência de responsabilidades do Estado na educação à iniciativa privada (em todos os níveis, etapas e modalidades), e contra todos os ataques aos direitos trabalhistas e previdenciários de seus profissionais;
- contra as iniciativas de privatização da educação pública (via organizações sociais na educação, parcerias público-privadas, entre outras), de institucionalização da educação domiciliar, de militarização das escolas, de promoção da intolerância religiosa; contra a naturalização de grupos fascistas e movimentos conservadores como “Escola Sem Partido” e suas correlatas, como as “Leis da Mordaça”;
- contra os cortes orçamentários, os contingenciamentos, os bloqueios e o sucateamento das instituições da educação básica, das universidades e dos institutos de educação, ciência e tecnologia, e contra quaisquer ataques do Poder Político e do Poder Judiciário em relação à autonomia universitária e à escolha dos seus dirigentes;
Precisamos reafirmar que a retomada do Estado Democrático de Direito exige, mais do que nunca, que seja assegurado o processo democrático, inclusive o resultado eleitoral, em todos os níveis, conquista fundamental da nossa sociedade, fruto de muitas lutas ao longo das últimas décadas.
Ratificamos nossa luta pela retomada democrática do Fórum Nacional de Educação (FNE) e das Conferências Nacionais de Educação nos moldes no Plano Nacional de Educação.
Portanto, com a centralidade da plataforma acima assinalada, fruto dos nossos acúmulos históricos, propomos apresentar, no dia 15 de Agosto, a “Carta Aberta do FNPE: em orientação ao voto, pela Educação, pelo Brasil” junto com um calendário de Lutas e Conquistas pela educação e pelo Brasil:
15 de agosto: Consolidação do Documento Final aprovado na Conape 2022, com as contribuições de nossas plenárias
15 de agosto: Divulgação da Carta Aberta do FNPE, de orientação ao voto pela educação, pelo Brasil, com diretrizes para a ampliação e consolidação da bancada da educação em todas as esferas de governo
16 de agosto a 16 de setembro: Movimento “Educação com Lula”
16 de agosto a 30 de setembro: Campanha do FNPE, em busca de votos pela Educação e pelo Brasil
17 de setembro, 15h: Pleno do FNPE para avaliação da Conape 2022 com a presença da Coordenação dos Fóruns de Educação, no Recife-PE
19 de setembro, 9h: Plenária Mundial Popular de Educação no Centenário de Paulo Freire
Com tal plataforma e calendário urgente de lutas, ratificamos que a educação nacional pública (com gestão pública, gratuita, laica, inclusiva, democrática e de qualidade social) é o sustentáculo das sociedades democráticas e soberanas. Assim, não poderemos permitir a apropriação do fundo público pelo que capital em detrimento dos serviços públicos de qualidade de que a imensa maioria do povo brasileiro necessita e que, com os últimos governos e suas iniciativas, vêm sendo destruídos.
Ratificamos, decididamente, a defesa do Estado democrático de direito em sintonia com respaldo da Constituição Federal de 1988, do PNE de 2014, CONAPE 2018 e 2022, na consolidação de um projeto soberano de Estado que garanta uma educação nacional, pública e de gestão pública, gratuita, inclusiva, laica, democrática e de qualidade social para todas, todos e todes.
Natal, Rio Grande do Norte, 17 de julho de 2022
PLENÁRIA FINAL DA CONFERÊNCIA NACIONAL POPULAR DE EDUCAÇÃO (CONAPE 2022)
FÓRUM NACIONAL POPULAR DE EDUCAÇÃO
Educação pública e popular se constrói com democracia e participação social: nenhum direito a menos e em defesa do legado de Paulo Freire