Com orçamento 86% menor que em 2013, ciência brasileira resiste (mas está no limite)

Com orçamento 86% menor que em 2013, ciência brasileira resiste (mas está no limite)
Com orçamento 86% menor que em 2013, ciência brasileira resiste (mas está no limite)

Como ficou provado durante a pandemia de Covid-19, o Brasil tem capacidade de produzir pesquisas científicas de alto nível, mesmo em meio aos sucessivos cortes orçamentários promovidos pelos governos de Michel Temer e de Jair Bolsonaro.

Porém, os esforços dessas duas gestões para desmontar as bases estruturais que amparam a produção do conhecimento científico nacional estão colocando em risco o desenvolvimento do nosso país.  

A Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) produziu um relatório especial sobre investimentos em pesquisa e desenvolvimento no mundo, avaliando o período entre 2014 e 2018.

Os dados indicam que houve uma drástica redução das verbas destinadas à ciência e tecnologia no Brasil, mas, mesmo assim, nossa produção científica continuou aumentando.

Isso mostra que os pesquisadores brasileiros possuem alto grau de comprometimento e resiliência.

A questão é: até quando será possível aguentar?

Redução no orçamento global do Ministério de Ciência e Tecnologia

Segundo o relatório da Unesco, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações teve 84% de seu orçamento reduzido no período de 2012 a 2021: de R$ 11,5 bilhões (em valores atualizados pela inflação) para R$ 1,8 bilhão, que é o que havia sobrado após desvios para outras pastas, bloqueios e despesas obrigatórias (como salários). Já seria o mais baixo do século.

Segundo o mesmo relatório da Unesco, países que investem menos de 1% do PIB em ciência e tecnologia costumam passar de produtores de ciência a consumidor. Isso é muito grave, porque o Brasil já foi um grande produtor de conhecimento.

Após os cortes, cerca de R$ 690 milhões seriam destinados para ciência e tecnologia, principalmente para o Edital universal do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que abrange bolsas da iniciação científica ao pós-doutorado de 30 mil pesquisadores, e o financiamento dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia.

Só que em outubro o governo cortou 87% desses recursos (que foram para outras pastas, para que políticos do Centrão possam usar com fins eleitoreiros), deixando apenas R$ 89 milhões, sendo que a maioria do que sobrou seria destinada para a produção de medicamentos de combate ao câncer.

Para fins de comparação, esse montante representa ínfimos 0,004238% daquilo que foi destinado para pagamento e refinanciamento da dívida interna com o sistema financeiro (R$ 2,1 trilhões, metade dos gastos do Governo Federal no ano).

Já para o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o orçamento em 2021 foi R$ 1,21 bilhão, o pior do século. Esse montante representa praticamente a metade do que era investido lá em 2000.

O maior orçamento destinado ao CNPQ foi o de 2013: R$ 3,14 bilhões, quase o triplo do atual.

O número de pesquisadores apoiados pelo CNPq também vem caindo. Entre 2011 e 2020, as bolsas de mestrado tiveram uma redução de 32% (de 17.328 para 11.824), as de doutorado caíram 20% (de 13.386 para 10.738), e o valor desses auxílios não sofre reajuste desde 2013 (seria corrigido em 2016, ano em que Michel Temer deu o golpe para assumir o poder).

O investimento total em pesquisa científica e desenvolvimento tecnológico no Brasil, em proporção ao seu Produto Interno Bruto (PIB), aumentou de 1,08%, em 2007, para 1,34% em 2015. Após queda para 1,26%, em 2017, a estimativa atual é que o percentual esteja em torno 1% do PIB, muito abaixo de países desenvolvidos como Estados Unidos e Alemanha, que investem quase 3%, e da China (que aumentou em 225% os investimentos entre 2008 e 2018 e agora aplica cerca de 2,2%).

Resistência

Mesmo asfixiada pelos cortes de recursos, a pesquisa brasileira conseguiu manter uma boa posição no mundo. Dados de um relatório do Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CEGE) colocam o Brasil como o 13º maior produtor de conhecimento científico no mundo.

Entre 2015 e 2020, o relatório indica a participação de brasileiros em 372 mil trabalhos acadêmicos publicados internacionalmente, o que corresponde a 3% da produção científica mundial acumulada no período.

Entre os temas abordados pelos pesquisadores brasileiros com mais repercussão internacional estão educação, biodiversidade, nanopartículas, pecuária e aquicultura, agricultura e irrigação, saúde pública, física teórica, fisiologia e esportes, solos e lavouras, e inovação e sustentabilidade.

Por mais que haja um esforço heroico por parte dos pesquisadores, os efeitos dos cortes são sentidos diretamente dentro das universidades públicas, que produzem 99% da pesquisa brasileira mas enfrentam dificuldades de pagar suas contas básicas.

Esse cenário vem causando um fenômeno chamado de “fuga de cérebros”: pesquisadores brasileiros altamente qualificados estão indo embora do Brasil para conseguir manter suas pesquisas.

Caso não haja uma mudança drástica na forma como o Governo Federal trata nossos pesquisadores e o trabalho científico no Brasil, a tendência é que a situação piore, com dificuldades cada vez maiores para manter a qualidade e a relevância no cenário internacional.

Fonte: APUB

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