A mesa “Universidade e Democracia: o momento atual”, promovida pela Apub na manhã de hoje (17), como parte da programação do sindicato no Fórum Social Mundial, trouxe Luís Felipe Miguel da Universidade de Brasília, professor que propôs a disciplina sobre o golpe de 2016; além dele, o reitor da UFBA João Carlos Salles, o reitor da UFRB, Silvio Soglia representando a Andifes e a professora Maria Hilda Baqueiro, diretora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFBA. O debate aconteceu no auditório Margarida Alves, na Tenda da Central Única dos Trabalhadores (campus de Ondina da UFBA).
A diretora da Apub, professora Raquel Nery, responsável por coordenar a mesa, iniciou sua fala contextualizando a discussão proposta pelo sindicato, indicando que vivemos um momento de sucessivos ataques à autonomia universitária e pedagógica.
O professor Luís Felipe introduziu o debate falando sobre a discordância compor a normalidade da academia, referindo-se às esperadas reações quando propôs a disciplina “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, na UnB. Porém, segundo explica, o que está fora da normalidade é a tentativa de impedir que a disciplina aconteça, ainda mais sendo patrocinada pelo Ministro da Educação. De acordo com o docente, o que mais incomodou nesta disciplina foi o uso da palavra ‘golpe’ e que esta denominação não é metafórica – ao contrário, na teoria política há uma compreensão estrita sobre o significado e utilização desta para determinadas circunstâncias. “E é exatamente por isso que os cursos sobre o golpe incomodam alguns. Eles sabem que não estamos criando espaço de panfletarismo. Eles têm medo porque a universidade é o espaço onde esse debate vai se refinar, se qualificar e formar. Nós vamos devolver à sociedade instrumentos para reflexão da realidade”, afirma.
O professor falou sobre os ataques à educação e ao ensino, explicando que são ações coordenadas: “de um lado, a redução das nossas condições materiais de trabalho, de manter a qualidade de nosso trabalho; de outro, que tem crescido de maneira forte, a intimidação aos professores e estudantes, assim como às instituições do ensino básico e superior, que tem como símbolo a “Escola sem Partido”. Esse processo, como definiu, é em escala global. No Brasil, especificamente, o vivenciamos com a ameaça de princípios básicos da Democracia, que é o espaço para a diversidade de ideias e para reflexão crítica. “Desnaturalizar processos considerados naturais, aprofundar compreensões da realidade, pensar as questões do mundo como abertas à transformação é o papel do debate, do pensamento crítico e para isso, a Universidade é fundamental”, defende Miguel.
Em seguida o reitor da UFBA falou sobre a capacidade da Universidade se autorregular, exercer suas prerrogativas e funcionar bem. Para ele, os ataques à autonomia universitária demonstram enorme ignorância e obscurantismo, por parte de pessoas que não entendem a construção e evolução do conhecimento. “É verdade que a Universidade tem servido historicamente à elite, mas ela também é hoje o espaço de combate às desigualdades e do exercício da democracia e da liberdade, esse é nosso desafio”.
Silvio Soglia, por sua vez, representando a Andifes (Associação Nacional dos dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) falou sobre o entendimento da entidade de que vivemos um período de sofisticação das medidas de exceção, com três elementos básicos: a judicialização, onde interpretações valem mais do que provas, e onde ações excessivas são executadas pela Polícia Federal; a atuação da mídia hegemônica; e setores do parlamento brasileiro que se utilizam do poder para alimentar este conjunto de ações que não são espontâneas, mas sim articuladas.
Soglia lembrou do episódio quando a UFRB foi impedida, através de liminar de um juiz, de conceder o título de Doutor Honoris Causa ao ex-presidente Lula. Além da liminar, a PF também foi acionada para garantir que a atividade não acontecesse. Mas, para ele, o que ficou de resultado foi a grande mobilização, em ato político, que criou-se na cidade: “demos uma grande resposta de que a universidade é um grande reduto de resistência e de luta, e de contribuição para sociedade brasileira, principalmente neste momento que vivemos”.
Nesse mesmo sentido, a professora Maria Hilda enfatizou que a ação do Ministro da Educação conseguiu um efeito reverso e unânime inédito, porque já são cerca de 44 universidades, incluindo a UFBA, que vão incluir a disciplina sobre o golpe como componente curricular. A professora concluiu falando sobre a liberdade da ciência ser combustível para contestação e para construção de um projeto de cidadania plena a todos os seres em sua diversidade.
A mesa, que encerrou a participação da Apub Sindicato e do Proifes-Federação no Fórum Social Mundial, sintetizou o objetivo de ambas entidades durante todo evento: a defesa irrestrita e unitária da Universidade pública e autônoma, o que só é possível a partir da luta pela consolidação da Democracia no nosso país.