“Este é um movimento popular pela Democracia”. Com essa definição do Na Trilha da Democracia, o escritor e teólogo Leonardo Boff, um dos maiores intelectuais progressistas do país, abriu a 10ª edição do projeto na noite desta quarta-feira, 13 de março.
Com o hall da reitoria e o auditório Otto Brito de Guerra absolutamente lotados, Leonardo Boff, um dos principais expoentes da teologia da libertação, corrente progressista da igreja católica, falou sobre os desafios para restabelecer a Democracia e garantir Direitos Humanos “dentro de um estado de exceção, que atropela leis e não respeita a legalidade das coisas”.
Sob forte emoção, Boff iniciou sua exposição fazendo um contraponto às manifestações de intolerância e desrespeito aos direitos humanos ao lembrar de trágicos acontecimentos que “nos fazem sofrer e até chorar”, como o assassinato de jovens estudantes na escola de Suzano, a morte do neto do ex-presidente Lula, de apenas 7 anos, e “toda a situação do nosso país que ataca toda a raiz da nossa soberania, da nossa democracia, e nos envergonha”.
Com a assertiva de que os direitos humanos são uma das conquistas civilizatórias mais importantes da humanidade e pressupõem que cada ser humano tem valores que devem ser respeitados, Boff ressaltou a importância de tratar as temáticas Democracia e Direitos Humanos de forma articulada por terem componentes que se exigem mutualmente.
“Depois de mais de 70 anos de assinatura da carta da terra sobre os direitos humanos e 30 anos da nossa Constituição, que significou consenso, acordo social, é colocado em questão a Democracia e Direitos Humanos. Constata-se que a observância aos Direitos Humanos a nível mundial, especialmente em nosso país, é absolutamente insuficiente”, afirmou Boff.
Boff atribuiu ao sistema econômico financeiro as crescentes violações sistemáticas a direitos humanos e de ameaças à democracia em todo o mundo. São “tempos de barbárie, cruéis e sem piedade”, disse, onde “as grandes nações, aquelas que comandam a economia e a política mundial estão cada vez mais violentas, atropelam as Constituições e não respeitam os Direitos Humanos”.
Essa realidade de conflitos, tensões e rupturas, Boff aponta como consequências à natureza da sociedade dominante no mundo. “Trata-se de uma sociedade cujo o eixo articulador é a economia capitalista. Esse tipo de economia que se orienta só pela competição e nada pela cooperação. É Guerra dos ‘eus’, onde cada um diz ‘eu’ e não consegue dizer ‘nós’”.
Para ele, o mais importante na sociedade hoje é respeitar a opção e posição dos outros, mesmo que não compartilhemos da mesma visão. Contudo, observa que há uma crescente prática da intolerância. “Nossa crise é uma das mais graves, nós estamos dentro de um estado de exceção pós-democrático, sem lei. A situação é dramática porque ninguém sabe para onde nós vamos. A diferença do nosso governo para o atual é que nós tínhamos dignidade. Estamos aguardando uma decisão para um rumo no nosso país que até agora não surgiu”.
Ao falar sobre a situação do país após a vitória de Jair Bolsonaro, Boff afirmou que “vivemos uma democracia reduzida, de baixa intensidade, que não representa o povo, mas os interesses de grupos que apoiaram eleições”. Para ele, as políticas públicas não podem se guiar, como hoje vemos no Brasil, pelo não respeito à diversidade de opiniões, à dignidade do ser humano. Mas o que se observa é uma profunda intolerância, orquestrada de cima para baixo, contra os homoafetivos, contra as mulheres, contra os indígenas, contra os mais vulneráveis, especialmente os afrodescendentes, que são 55,4% da população brasileira”.
Daí a importância, para ele, em se resgatar a Democracia e os Direitos Humanos, dois valores fundantes sem os quais a humanidade encobre seu próprio rosto.
O professor Leonardo Boff, que é também ecologista, finalizou chamando o público para um novo olhar, que extrapola os direitos humanos e passa a considerar também os direitos da natureza. Ele citou a última encíclica do papa Francisco, que pede à humanidade para cuidar da casa comum, que é o planeta.
A palestra na íntegra está disponível no canal do ADURN-Sindicato no YouTube – https://www.youtube.com/watch?v=cFbIhwLY4v4
Fonte: Ascom ADURN-Sindicato