Em 2019, um deputado PSL (partido pelo qual Bolsonaro se elegeu) apresentou a PEC 206/19 que permite cobrança de mensalidade aos alunos das universidades públicas. Nascida a partir um relatório defasado do Banco Mundial, a gratuidade permaneceria apenas para estudantes comprovadamente carentes, definidos por comissão de avaliação da própria universidade. Isso porque o diagnóstico partia de um princípio equivocado de que nas universidades públicas estudam apenas os “filhos da elite”, ou seja, de quem poderia pagar.
De fato, o Brasil já foi assim. Mas não é mais, graças sobretudo às políticas de inclusão dos governos a partir de 2003 e à aprovação da Lei de Cotas. Segundo pesquisa da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), 70,2% dos estudantes das universidades federais tinham renda mensal familiar per capita de um salário-mínimo e meio no ano de 2018.
Ou seja, a maioria dos alunos das federais – que compõem o maior sistema público de ensino superior no país – pertence à faixa de menor renda. Sendo assim, a cobrança de mensalidade atingiria uma pequena parcela de estudantes, desmontando a base do discurso a favor da cobrança por conta do suposto “custo” das instituições.
Crise de verdade
A verdadeira crise tem sido causada pelo próprio governo Bolsonaro que adotou uma série de políticas de contingenciamentos, bloqueios e cortes no Ministério da Educação – um movimento historicamente conhecido para justificar a privatização. Só em 2022, o corte será de mais de R$ 3 bilhões, o que representa mais de 14,5% do orçamento – que vai afetar de modo expressivo todas as áreas, sobretudo as universidades, institutos e cefets.
Intromissão fardada
Como se não bastasse os desvarios do governo Bolsonaro, um grupo de militares, com apoio do vice-presidente Hamilton Mourão, também publicou um projeto de dominação política até 2035 que incluía, entre seus delírios absolutistas e paranoias infantilizadas, o fim da gratuidade do Sistema Único de Saúde (SUS) e cobrança de mensalidade nas universidades públicas.
O objetivo do grupo é limitar o debate acadêmico e a liberdade de cátedra – todos pontos garantidos pelo artigo 207 da Constituição, que estabelece o conceito de autonomia universitária.
Se isso acontecesse, desestruturaria a capacidade de resolução de demandas das instituições, impactando a permanência estudantil, e criaria “subclasses” dentro das universidades, o que deixaria os espaços em permanente ebulição, além de ferir o conceito de universalidade da educação pública.
Depois de muito debate na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados e de muita pressão social, os parlamentares optaram por não convocar as audiências públicas que era pré-requisito para o avanço do projeto. Mas o governo não retirou o projeto.
Portanto, o risco permanece latente e, caso seja reeleito, Bolsonaro deve retomar essa proposta.
Em um governo de recuos e marcado pela irresponsabilidade, constantes ataques à educação pública, sobretudo contra as universidades, a ameaça ao ensino público de qualidade segue em permanente estado de emergência.
Fonte: APUB