Em março de 2017, no ano seguinte à tomada do poder por Michel Temer, o Congresso Nacional aprovou a nova legislação que liberou a terceirização irrestrita e, logo depois, a Reforma Trabalhista, em abril do mesmo ano.
A ideia principal era “flexibilizar” as relações de tabalho na iniciativa privada e, diziam seus apoiadores, a reformulação faria o Brasil gerar milhões de empregos.
Passados quase quatro anos os resultados foram mínimos na geração de empregos (pelo contrário, vieram recordes de desemprego) e, se pode ser apontada alguma mudança, foi justamente o aumento da precarização de vínculos trabalhistas.
Usando o mesmo pretexto da “flexibilização” aliada às mentiras de “redução de custos” e “aumento da eficiência”, mas agora no serviço público, o governo de Jair Bolsonaro deseja aprovar uma nova reforma: a Administrativa, uma espécie de Reforma Trabalhista, mas voltada aos servidores de todo o país e de todas as esferas (União, estados e municípios).
Assim como as outras reformas aprovadas desde 2016, ela irá retirar direitos dos trabalhadores e gerar prejuízos a toda a população, que terá à disposição serviços com menos qualidade ou, em muitos casos, menos atendimento de demandas.
Terceirização irrestrita
A Reforma Administrativa abrirá caminho para as terceirizações praticamente sem limites no setor público. Autorizados pela legislação, a União, estados e municípios poderão firmar cada vez mais contratos com entidades privadas.
Os riscos são enormes. A terceirização já existe na administração de serviços públicos, como a presença de Organizações Sociais (OS) na saúde ou na educação, e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) – que administra hospitais universitários. O problema é que elas poderão ser ampliadas para diversas áreas, inclusive dentro da universidade. O projeto é extremamente vago em relação ao alcance de suas medidas.
Mas o foco central é que o Estado será relegado a um papel de coadjuvante (o termo no projeto é “subsidiário”), enquanto as empresas tornam-se as principais responsáveis pelos serviços. Obviamente, elas irão privilegiar apenas áreas e regiões lucrativas.
Isso irá afastar a capacidade de gestão do próprio poder público sobre os serviços prestados que ficarão sob responsabilidade dessas organizações.
Dentro das terceirizações, é comum o desrespeito aos direitos trabalhistas, uma vez que o Estado tem pouca gerência sobre esses funcionários.
Não haverá sequer mecanismos de controle sobre desempenho e qualificação dos trabalhadores (diferentemente do que ocorre atualmente, já que servidores ingressam por concursos públicos e são permanentemente capacitados). Os trabalhadores, a maioria com vínculos precários, se sentirão intimidados a ceder a pressões de todos os tipos enquanto exercerem suas funções.
E nas universidades públicas?
Uma das manobras do Governo Federal é deixar em aberto diversos pontos importantes, para que a aprovação do projeto seja mais fácil e sofra menos resistência agora. Por isso, a Reforma deve ser fatiada em etapas.
No que foi apresentado até agora, não há nada que deixe evidente como o projeto afetaria a contratação de docentes e servidores técnico-administrativos. Algumas questões estão em aberto como, por exemplo, se o governo decidir que não vai mais abrir concursos para contratação de novos servidores (docentes e técnicos). A contratação passaria a ser por OS?
Se isso vier a ocorrer, afetaria profundamente a qualidade do ensino e a autonomia didática e científica das instituições, já que docentes não teriam mais garantida a liberdade de cátedra e de pensamento (como já ocorre na maior parte da educação privada) e não poderiam se manifestar, expressar opiniões, contrariar o governo ou promover mobilizações por direitos. Além disso, professores poderiam ser escolhidos por critérios políticos e ideológicos (o que é um dos sonhos de governos autoritários, como o atual).
Na propaganda, eficiência, na prática, mais dinheiro às empresas
Não há nada no projeto do governo que tenha como objetivo o aumento da qualidade ou da “eficiência” dos serviços públicos.
A Reforma Administrativa se encaixa em uma sequência de propostas que, desde a Constituição de 1988, vem abrindo cada vez mais espaço para a entrada de empresas privadas no setor público.
A ideia é deixar o mercado e as grandes empresas responsáveis por atender mais parcelas de “mercado consumidor” (porque é assim que eles enxergam a população).
Os resultados já são conhecidos: queda na qualidade dos serviços, aumento de custos para o Estado e uma enorme oportunidade para corrupção.
Em um país ainda marcado por profundas desigualdades histórias (apesar dos inegáveis avanços entre 2003 e 2016), o Estado precisa ser cada vez mais atuante. Por isso, barrar a Reforma Administrativa é essencial para que a população continue tendo acesso a serviços públicos de qualidade.
Fonte: APUB