No dia 06 de novembro, a Apub realizou uma reunião ampliada para discutir violência, universidade e condições de trabalho docente. Para explanar sobre o tema, foram convidados os professores da Faculdade de Direito, Misael França e Carlos Eduardo Freitas. A atividade deu início à semana de mobilização pela valorização docente e em defesa do Serviço Público, tendo como uma das pautas o arquivamento definitivo da PEC 32.
“Inaugurar a semana de mobilização dessa forma é fundamental, no sentido de pensar as situações de violência, os fatores endógenos e exógenos à Universidade, e como, do ponto de vista institucional, a gente discute e protege essa docência. Pensar a campanha de valorização do servidor não pode ser abstrato e sim a partir da concretude, do que fazemos e do que pode ser aperfeiçoado”, iniciou a presidenta da Apub, professora Marta Lícia Teles.
Ela também contextualizou o processo de campanha salarial 2024 dos servidores públicos federais, lembrando que há um acúmulo de seis anos de perdas salariais, além da precarização das condições de trabalho e dos ataques sofridos pela categoria pelo governo anterior. E lembrando que a PEC 32 é uma ameaça direta aos docentes porque sua aprovação possibilitaria a ampliação da terceirização, da contratação de profissionais temporários sem concurso público, redução de jornada e salários, entre outros pontos danosos.
Em seguida, o professor Ponciano Carvalho, diretor do sindicato, em seguida falou sobre recentes acontecimentos que afetaram a população de Salvador e também a rotina da Universidade, a exemplo dos conflitos nas comunidades do Alto das Pombas e Calabar. Ele questiona se o que tem sido chamado de crise da segurança pública é, de fato, uma crise ou é resultado de uma política instaurada há anos no país, passando assim a fala para os debatedores.
O professor Misael França, doutor em Direito, Processo e Prática Penal, abordou a interface entre segurança pública e o trabalho docente e produção acadêmica. Para ele, não há crise, as coisas estão como deveriam estar, segundo a política de segurança pública. A questão mesmo é: a quem interessa esse estado de coisas? Quem ganha com isso?
Ele falou também sobre a cultura eficientista, populista e midiática dessa política de segurança pública, que apresenta o sistema penal como solução de problemas sociais. E também lembrou que estamos diante de duas formas de violência na Universidade: endógena – intramuros; e exógena, para além dos muros, que geram consequências para o ambiente interno. Nesse sentido, a categoria docente tem sido apresentada como inimiga para a sociedade, na perspectiva de um maniqueísmo que coloca professoras e professores como nocivos para a coletividade. Isso tem se incrementado nos últimos anos e reforçado o ambiente acadêmico como hostil, inclusive para seu próprio corpo docente. “A misosofia (aversão ao conhecimento) tem colocado em cheque a qualidade do trabalho docente e a qualidade da própria universidade. E ainda estabelecido uma mediação de forças entre corpo docente e discente, numa lógica instaurada de conflito, de combatividade, a partir de uma lógica maniqueísta. “Precisamos identificar pontos de convergência entre as violências internas e externas à Universidade, encontraremos talvez respostas à tática de aversão ao conhecimento. Temos um movimento interessado em asfixiar a produção de conhecimento no Brasil. Fomentar a reflexão a respeito das questões sociais não interessa ao neoliberalismo, no sentido de não permitir o debate de ideias que poderiam interferir no atual modelo e projetos de políticas públicas”, afirma Misael.
Ele trouxe algumas propostas, como de debater sobre a concepção de bem comum da Universidade, da atividade acadêmica e da produção de conhecimento; e persuadir a comunidade a fim de que se compreenda que estamos tratando de algo de interesse coletivo – segurança pública e trabalho docente é uma bandeira da coletividade; dialogar com as forças de segurança pública e com a Universidade para evitar a disseminação de notícias falsas, comum e frequente como tática de desinformação a serviço da pós-verdade, uma face negativa do neoliberalismo e contraproducente para a comunidade acadêmica.
O professor Carlos Freitas, doutor em Sociologia e advogado de Direito do Trabalho e Sindical, trouxe aspectos ligados à saúde do trabalhador e da trabalhadora docente, relacionando com a questão da violência. “A violência tem dimensões e é feita de pequenas e contínuas violações dos direitos. Enquanto servidor público, há pequenas e contínuas violações ao bem-estar e saúde quando não são respeitados os dispositivos institucionais para garantir a saúde do trabalhador”, afirmou. Para ele, é preciso uma luta articulada entre sindicado e universidade por melhores condições de trabalho de forma a proteger a saúde do professor e da professora.
Outra dimensão que ele traz é a relação do cotidiano entre as/os colegas, e entre docentes e estudantes. Essas relações estão tensionadas a provocar problemas para a saúde também.
Ainda, falou sobre produtivismo, afirmando que não faz sentido discutir essas questões sem que toquemos na valorização do trabalho docente e na sobrecarga de trabalho. “Discutir violência passa por discutir questões como as violações de direitos no campo das condições de trabalho, mas também por valorização mais ampla da categoria pela sociedade”.
Como proposição, apontou a necessidade de trazer para a pauta as questões de saúde do trabalhador/a – exames periódicos, equipamentos de proteção individual, a relação de quantidade professor x aluno, equipamentos de trabalho para sala de aula e pensar protocolos e orientações para tratar conflitos e como lidar com a realidade de muitos estudantes em vulnerabilidade social.
Após a exposição, veio momento de debate entre presentes que trouxeram questões sobre terceirização, medidas de segurança, fortalecimento e autoreconhecimento da categoria, relação entre docentes do Magistério Superior e EBTT, debates sobre a cultura da violência e pensar como pesquisas e programas podem contribuir nessa questão, entre outros pontos.
A diretoria lembrou que o sindicato realiza um programa de promoção à saúde docente, em parceria com IMRS/UFBA e o departamento de educação física, e também ressaltou que a realização do ‘Apub na Escuta’ tem sido fundamental para acolher demandas relacionadas às condições de trabalho nas diferentes unidades e campi das IFES baianas.